Abril.

 Os dedos no volante do carro, apreensivos, dançam de forma coreografada, fazendo um ritmo próprio, talvez algum ritmo que possa combinar com a música que tocava na rádio naquele instante. A noite estava fria lá fora e o ar estava ligado lá dentro. Os outros passavam em direções opostas, meus olhos continuavam pregados no asfalto e a velocidade continuava a mesma. Seguia uma longa avenida que daria em uma longa estrada para uma outra cidade qualquer. A respiração continua, o farol iluminando as faixas amarelas que separavam a direita da esquerda. A ida da volta e a volta da ida.
 Não pense que estou aqui porque quero. Simplesmente tenho que estar. Estou caminhando sobre quatro rodas em alta velocidade. Pareço aflita mas não estou... As afirmações não são tão sinceras. Suspiro brevemente, como se não houvessem mais respostas.
 A noite parecia estar mais escura do que o normal. Não havia lua e nem havia muitas estrelas e eu já começava a me sentir completamente perdida. O maço de cigarro no banco ao lado, as coisas jogadas no banco traseiro, meus olhos concentrados e minha cabeça longe. Talvez eu estivesse pensando em como eu gostaria de estar caminhando sozinha, com meus próprios pés por essa estrada. Sem luzes e sem nada. Numa solidão tremenda, a qual me causa efeitos alucinantes, a qual eu acenderia meu cigarro, daria um longo trago e me deitaria no meio do asfalto sujo e quente. Os cabelos espalhados, nem sinal de carros, nenhum barulho a não ser de alguns grilos na mata distante. Talvez eu gostasse de fechar os olhos e adormecer. Acordar e nada acontecer. Ainda seria noite e eu ainda estaria alí. Completamente só.
 Não sei ao certo se gosto muito disso, se tenho os pés fixos aonde quero chegar e consigo repensar mais uma vez sobre hipóteses que não fazem sentido algum para mim. Gostaria de ver o mundo, uma vez só, em camera lenta e assim, eu veria aquelas luzes distantes, se aproximando tão lentas que eu teria tempo de me esconder. Queria ver outras luzes se afastando também, como se nunca mais fossem voltar. Me deixando no escuro daquele lugar tão infinito.
 Então, talvez as estrelas pudessem surgir daí e eu seria capaz de ver todas as constelações. Me perguntaria trilhares de vezes se gostaria de passar o resto da minha vida alí, sem nada, sem luzes e sem luas. Pestanejando lentamente, como se não fosse capaz de acordar mais e veria tudo o que fiz diante de meus olhos, espalhados por cada canto daquele horizonte negro azulado, com pequenas pontinhas coloridas voando sobre os céus, então descobriria que ao invés de estrelas, quando abrisse meus olhos, estaria olhando para inumeros vagalumes que dançariam a minha volta. Voariam lentamente, livremente, como se não tivessem pressa de chegar. Eu aceitaria sua luz. Talvez até aprendesse a acreditar no que me soa absurdo.
 Eles dançariam, o meu cigarro queimaria, os meus olhos se abririam e eu estaria em casa. Numa noite qualquer de Abril, olhando pela janela e imaginando como seria se eu tivesse ido.

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