Archive for junho 2012

Gregos e Troianos.

 As ondas fracas na beira do mar indicavam um fim de tarde ensolarado, enquanto em alto mar, uma tempestade agitava a maré, como gregos e troianos, as ondas passaram a guerriar entre si, cada vez maiores, mais fortes e mais temerosas.
 Cheguei até elas e pude participar do espetaculo, enquanto o vento me rasgava as velas, favorecendo as ondas troianas, que me destruíam lentamente e atacavam as ondas gregas cada vez mais sedentas e violentas. Quebravam e rasgavam-nas ao meio, enquanto as gregas não perdiam a fé no remo e eram ajudadas pelas lágrimas que caíam do céu naquele instante, implorando para que a maré baixasse, para que pudessem resolver de uma forma mais pacifica, consequentemente, irritando as ondas gregas que agora já estavam quase invenciveis. Tão temerosas quanto os raios que caíam ao fundo.
 Rasgaram as ondas troianas ao meio, destruiram-nas a fé, o amor, o calor, a fome, a miséria e todos os sonhos que haviam construido conchinha por conchinha, matando-nas cruelmente, sem deixar vestigios e rastros de espuma, que alertava as outras ondas sobre a guerra ocorrida naquele final de tarde de Junho.
 O pior de tudo, é que no final, ninguém viu. Ninguém vê. Ninguém sente. Porque ninguém quer estar em alto mar, ninguém quer enxergar. Ninguém quer salvar gregos e troianos.

(Conto do verso da pequena folha. Engraçado como ambos ficaram ruins.)

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Um dia no deserto e uma noite na cidade.

 Chuva gelada que caía de um céu escuro mais gelado ainda, atrapalhava a visão dos automóveis que buscavam seus rumos, guiados pelas luzes que atropelavam a escuridão e que emergiam das construções e em nenhum delas, estou.
 Areia seca, longe de qualquer cidade e nos cantos de uma estrada, estou eu. Suando, sonhando e delirando. Dificilmente algum carro pára e eu posso até me deitar no asfalto escaldante e empoeirado para tirar um cochilo, esperando, esperando e esperando. Fecho os olhos e o sol continua a me tostar os neurônios, me impedindo de sentir a brisa do fogo me arder os dedos, os pêlos, os porques e os lábios. Me arder a dor, a música e a gaita que soava lá de longe.
 Roupas sujas e rasgadas, esperanças acidentadas e cabelos mal cortados, suados com os pés queimados. Até quando vou aguentar? E só pude abrir os olhos depois de ser engavetado.

(Conto mal feito que escrevi em uma metade de uma folha de papel, talvez seja por isso que tenha poupado muitas coisas dele.)

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Último Romance.

 Inverno. Brisa gelada que insistia em bater na minha janela, pedindo um atalho para se perder, para esfriar, para me tocar os cabelos e me fazer tirar os olhos do papel. Brisa gelada que movia as cortinas também, final de tarde de junho e um céu tão lilás quanto as flores da primavera que ainda estava por vir e eu nem esperava. Eu nem sabia. Eu nem via.
 Olhei o relógio por um instante ou outro. Procurava uma hora que nem sabia qual. Procurava você alí. Procurava seus traços, seus desenhos, seus sorrisos e mais os abraços das noites de outono. Amassava folhas e as jogava fora. Mordia canetas e manchava a boca, fechava os olhos e o tempo não voava, como nos filmes. E eu nunca chegava aonde queria chegar.
 De repente, uns passos pelo corredor gelado. Já estava de noite e a única luz acesa era a de meu quarto, fechado, lacrado, como uma cena de um crime. Como se eu cometesse um assassinato contra mim mesma e me escondesse. Como quem procurava uma resposta. Você chegou. Você chegou assim. Abriu a porta e me olhou nos olhos.
 - Quer café? Acabei de fazer.
 - Quero. - Então, como num suspiro, você se aproximou. Me entregou uma xicará com café e por dez segundos, me olhou nos olhos como nunca havia feito antes. Você nem me conhecia. Eu nem te conhecia. Nem sei porque estavamos alí. Nem sei como cheguei aqui. Nem sei porque escrevi tantas cartas em minha mente apenas para poder te olhar assim e finalmente sussurrar.
 - Quer ser o meu último romance? - Mas se eu esperasse você me responder... Talvez eu nem escrevesse isso.

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Os dois lados.

 Cê disse que perdeu seu tempo quando me viu fumando um cigarro, na soleira da casa ao lado, no terceiro degrau, com os jeans rasgados e os cabelos bagunçados. Cê disse que viu demais, cê disse que não viu nada. Cê me deu bom no dia no outro dia. Cê me entregou o jornal. Cê sorriu pra mim.
 Eu é que te vi. Eu é que sentei alí pra esperar você colocar a cabeça pra fora da janela e olhar pra mim. Fui eu quem cantarolou Los Hermanos na noite passada, que você acordou e reclamou. Fui eu quem te viu passar, andar, entrar e sumir, enquanto eu diminuía meus passos para não te alcançar. Fui eu quem leu jornal e deu um sorriso quando percebeu sua presença ao meu lado.
 Você quem me abraçou. Você quem segurou minha mão e inventou desculpas para sair comigo. Você que me olhava de um jeito, você que me cutucava, você que sorria e inventava assunto toda vez que encontrava oportunidade. Você que me levou. Você que tocou Los Hermanos na calçada de casa. Você que rasgou o jornal quando me viu ir embora.
 Eu é que quis te pedir pra ficar. Eu é que digitei mensagens e apaguei. Eu é que fiquei ouvindo Chico pra poder me inspirar e chegar até você. Eu é que quis fazer você sorrir. E agora?
 Cê que me deu um sorriso. Cê que me deu um carinho. Cê que me fez dar risadas estranhas. Cê que ouve Chico e gosta de coisas estranhas. Cê que podia ter dito algo mas nunca disse. E agora?
 Nunca vou saber dizer.
 Nunca vai me dizer?
 E quando isso acabar? Será que você vai saber?
 E quando isso acabar? Será que você vai me deixar saber?
 Eu acho que vou continuar te olhando daqui.
 Eu acho que vou fingir que não te vejo me olhando.
 Daí quem sabe depois de um blues, você seja minha.
 Daí quem sabe depois de amanhã, você possa me dizer..
 Que engano meu.
 Que engano seu.

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Uma janela, um conto e um apartamento.

 Tenho dito que detesto quando as coisas fogem do meu controle e tenho reclamado também de todas as atitudes que eu julgo inúteis, talvez inconvenientes, sei lá. Quem se importa com inconveniencia ou não?
 Eu não. Não ligo. O que me for confortavel, vestirei e se estiver fazendo muito sol, porque não fechar a cortina? Quem disse que eu me importo?
 Com o cheiro de cachaça na roupa, cigarro, maconha, tudo que eu gosto. Marcas de batons, de tintas, memórias quase transparentes de uma noite anterior em um clube que eu nem me lembro o nome. Tristeza, melancolia e seios. Muitos  seios.
 Embora os meus instintos me digam que faze-los seja mais interessante do que estabelecer um elo entre eu e outra pessoa (digo um elo firme, não algo fragilizado), de vez em quando, eu me fragilizo e nada posso fazer se o casulo se quebrar. Aí acontece tudo de novo e as sensações estranhas tomam conta de tudo aquilo que antes, me parecia ser facil de programar.
 Mas é sempre assim né? Você se senta numa mesa de boteco, bebe todas as cachaças do cardapio ou bebe varias doses da mais barata para se livrar daquela dor desgraçada que parece lhe dominar, desde os pés a cabeça. Parece incuravel, parece intocavel, parece ser tortura, parece... Sei lá. Parece ser uma doença que você consegue até mesmo esquecer do quanto era mais facil andar sozinho, embora muita gente insista que andar com alguém, seja bem melhor.
 Em contrapartida, eu fecho a janela e me esqueço de que há sol lá fora. Muito sol. E até mesmo de que posso apenas fechar as cortinas para que ainda consiga sentir todo o calor que ele oferece, eu ainda prefiro deixa-la trancada.
 Quem sabe um dia eu consiga entender tudo o que eu não consigo encontrar. Quem sabe um dia eu veja e quem sabe um dia... Eu te peça.

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Conversa de estranhos.

 Rua escura, noite estrelada e as vozes se misturando na esquina da padaria.
 Não era muito tarde, bastava ser meia noite e nada mais se ouvia por alí. As luzes sempre apagadas, passos as 23:30, talvez 23:45, caso estivesse atrasado e mais um monte poeira. A droga da rua nem sequer era asfaltada e isso facilitava o escurecimento das paredes do quarto dela, que já estavam amareladas.
 Menina diferente e de poucos amigos. Fumante profissional e entediada por natureza. Olhos verdes, cabelos castanhos e uma vida inteira pela frente.
 Hoje, não pensou que pudesse ser diferente e quando se sentou na janela de seu quarto para fumar o ultimo cigarro antes de dormir, ouviu ruídos que lhe pareciam comuns. Olhou para os lados e nada pôde ver, a não ser um reflexo em branco caminhando sobre a poeira. Forçou a vista mais um pouco para que pudesse enxergar melhor e vindo de sul para norte, estava lá, um rosto desconhecido, uma boina que parecia ser preta, uma camisa branca que já estava amarelada e calças surradas com sapatos que pareciam estar manchados.
 Derrubou seu cigarro pela janela enquanto ele se aproximava e assustada, deu um pulo para trás enquanto os olhos irreconheciveis, porém azuis, debaixo daquela boina preta a fitavam.
 - Boa noite. - Disse, num tom sutil, tentando não assusta-la. - Não vim lhe fazer mal, eu queria apenas... Lhe pedir uma informação.
 Ela, ainda assustada, fitou aqueles olhos azuis e com firmeza, escondeu o medo, aproximando-se da janela.
 - Diga.
 - Então... É que eu não sou daqui e estou procurando uma pequena vila nessa mesma direção.
 - Qual o nome?
 - Bem, eu não sei ao certo... Acho que é uma vila de pescadores.
 - Ah sim, sei de qual está falando. Pode continuar nessa direção que chegará lá.
 - Tudo bem, obrigado. - Ele deu um sorriso, enquanto acenou e preparou-se para ir.
 - Você é pescador? - Ela o interrompeu de partir.
 - Não... Na verdade, eu estou atrás do La Sierra Roja. Um navio argentino que está para partir. Eu quero navegar, conhecer os mares do mundo todo, quero sair, quero fugir. Quero esquecer tudo de ruim que já me aconteceu.
 - Acha que sendo marinheiro fará isso? Tá ouvindo muita Adriana Calcanhoto, não acha?
 - Não, não acho. Eu penso que como estou vivo, eu deveria tentar. Pode ser o que me faça feliz! Não preciso ser necessariamente um médico ou coisa do tipo, talvez eu precise estar lá, conhecendo os mares, navegando por todos eles e descobrindo coisas que nunca imaginara!
 - Desculpe, mas... Não sei se posso concordar.
 - Sim, eu imagino que não concorde. Eu quero experimentar algo que talvez possa me fazer feliz, porque muitas vezes o que nos faz feliz realmente, nunca é o que imaginamos! Talvez o que nos faça feliz esteja tão perto e nós nem ao menos possamos enxergar. Talvez eu tenha que me afogar na maresia para poder entender.
 Ela se calou, ouvindo-o com atenção e em certas partes, ele tinha razão.
 - Porque não se aventurar? Porque não tentar? Pode ser que o final lhe surpreenda, não? Eu acho que devo tentar. Você acha que deve tentar?
 E logo ela pensou em milhares de coisas que gostaria de fazer, mas que nunca pôde e logo deu um sorriso de canto.
 - Com certeza.
 - Então tente, antes que seja tarde. Antes que se arrependa apenas de não ter tentado. - E sorriu. - Mas preciso ir. Preciso encontrar esse navio e enquanto a você. Tente! - Voltou a caminhar na direção indicada por ela, logo se perdendo no meio da poeira amarelada enquanto ela se perdia em seus pensamentos distantes depois de uma pequena conversa estranha com um estranho que gostaria de ser marinheiro porque talvez, isso fosse o que lhe fizesse feliz e depois... Porque não se aventurar?
 Sussurrou algumas coisas e sorrira, desta vez, abrindo de vez a sua janela para não ter medo, para não se entediar e para, quem sabe, ser feliz.

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Um talvez.

 Faz tempo. Faz tempo que eu não escrevo nenhuma bobagem, que não tento nada, que não me inspiro, que não vejo mais nada além do meu nariz. Sei lá. Tô meio pra lá, tô meio pra cá, tô meio que no "nada". Não tenho nada.
 Engraçado que pra você, eu também parei de escrever. Pensei que as palavras não pudessem mais me ajudar a dizer qualquer coisa, talvez achasse desnecessario, embora saiba que a melhor forma é continuar de cortinas fechadas, pois o espetaculo pode acabar se tornando macabro. Pensei que rasuraria, pensei que pensaria antes de dizer qualquer coisa, mas não penso.
 O pior é "pensar" que tudo poderia dar errado se eu apenas dissesse algo. Que eu poderia acabar com tudo e fazer o vento te levar pra longe. Fazer algo que provavelmente não dê certo, já que faço isso melhor do que qualquer um. Tenho essa vantagem, creio eu (ou que não creio, porque odeio foder com tudo como sempre faço).
 Sabe, se eu escrevo, é porque talvez ainda há muito o que se ver. Talvez ainda goste de lhe admirar mesmo sabendo que nunca será parte de mim como quero. Talvez ainda goste do seu cheiro (eu adoro esse perfume que você usa, ele é perfeito pra você) e do seu sorriso que consegue ser mais sincero do que palavras proferidas quando se olha nos olhos.
 Talvez saiba desvendar. Talvez queira beber comigo e depois me deixar te olhar. Te entregar uma flor mais bonita e estender a mão para que possa, quem sabe, andar comigo. Uma caminhada alí ou pra lá, aonde você quiser que eu te leve. Uns sorriso quem sabe, violão, bossa nova, você, eu e uma vontade imensa de te ter por uma vez.
 Devo estar sentimental demais hoje. Apenas isso. Apenas um pequeno efeito de sabe-se lá o que.
 Um efeito seu.

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No calar da noite.

 "Se tenho pena, é porque tenho hora pra chegar. Cedo ou tarde, nós vamos estar lá.
 Seja melhor, seja mais forte e não tenha medo da resposta. Não se perca e não se misture.
 Um passo errado e tudo terá seu "fim", pleno como quem pode e quer."

 Escrotisse imposta pela sociedade medíocre. Não tema a morte, afinal, o suicidio soa prazeroso em sua grande parte.
 Sangue jorrando, pessoas trepando em homenagem a você. Penetram sua traquéia como quem lhe corta a pele numa autópsia.
 O pau, coberto pelo sangue jorrado de sua garganta se mistura com o gozo e a saliva. Os mesmos elementos que lhe cobrem o corpo despido, quente e arrepiado. O cesso dolorido lateja e o cuspe lubrifica.
 A tropa invade, a defesa luta porém se rende. Noite e dia, dia e noite, a tropa destrói e estupra as pequenas particulas de massa fedentinosa que escorria pelo cú mal cheiroso e ensanguentado, que agora se misturava com um liquido quente e branco. Escorriam pela pede até gotejar. Suor, gozo e merda.
 Batimentos acelerados, mais saliva para os corpos violentados, corpos invadidos. Corpos que se rendiam ao grotesco e a merda que naquele instante parecia prazerosa, lhe acariciavam o clitóris e os seios cheios de gozo. Mais sangue e finalmente, o descanso. Roupas e pêlos cobertos por liquidos macabros, agora já misturados e quase impossiveis de serem identificados.
 Uma mijada e o pau chacoalhando. Apaga-se a luz e o dia volta. O medo permanece e ninguém fica. Nem pelo sangue e nem pelo gozo.

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Filme francês.

 Foi assim que eu a vi. No meio da neblina numa boate cheia de corpos que se movimentavam com as batidas da música. Ela nem reparou. Ela nem olhou. Ela nem se movimentou.
 Cruzou os braços e esperou que o momento lhe dissesse o que fazer. Tomou uma garrafa de cerveja em suas mãos e se hipnotizou junto aos outros com o ritmo e o calor daquela pista tão vazia. Não estava realmente vazia mas eu a via como se não houvesse mais ninguém além de nós. Não sei nem seu nome. Não sei o que esperar de ti. Não sei nem o que dizer.
 - Vou lá fora. Fumar mais um.
 - Mas já? Acabastes de ir!
 - Quero outro.
 E fui. Fui com os olhos pregados nela. Fui com as cores iluminando a pista. Fui com as mãos molhadas de suor. Fui como se fossemos personagens de um filme francês. Aquele cabelo, aquele olhar, aquela roupa e toda a situação ao nosso redor. Não pense que estou apaixonada. Não sei bem o que foi que aconteceu naquele instante, mas gosto de descobrir que muitas vezes acabo por me surpreender com o que apenas os meus olhos conseguem ver. Nada que eu não sinta ou nada que eu não possa tentar sentir. Já disse que sentir é uma palavra bem forte e eu não entendo muito bem o seu significado.
 Agora se está me perguntando porque diabos eu venho aqui para tomar uma cerveja, fumar um cigarro e pensar em escrever coisas sendo que poderia estar dançando, é porque nunca lhe passou pela cabeça tal situação. Gosto de observar mas detesto música eletrônica. Gosto de saber o que se passa, o que as pessoas veem, o que pode acontecer alí mais tarde. Talvez até acabe encontrando alguém interessante no final da noite, embora as possibilidades sejam minimas, quase impossiveis. Não sei o que diabos eu estava fazendo alí mas eu estava.
 Dei um último trago e resolvi dar um fim ao meu filme francês. Nem o nome dela eu tive a vontade de descobrir e sabe-se lá o que se passa pela minha mente. Vou-me embora antes que o dia amanheça, vou-me embora enquanto ainda há tempo.
 Coloquei as mãos no bolso e saí pela noite escura, rumo a um boteco qualquer aonde meu filme francês não pudesse ter fim.

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Sobre o tecido da noite.

 Quando me deito sobre essa paisagem melancólica chamada noite e acendo o isqueiro na esperança de evaporar toda essa dor, penso em tudo o que eu poderia dizer ou no que eu poderia fazer caso estivesse ao meu alcance. Caso eu não estivesse tão embriagada pra ver. Caso eu não precisasse de pílulas pra me manter sorrindo por pelo menos um dia inteiro. Quem seria eu sem as minhas drogas diarias? Quem seria eu?
 Então, quando a lua decide aparecer, eu a observo como se o tempo pudesse parar. Como se as galaxias mais distantes pudessem ouvir os meus gemidos. Como se eu pudesse ser um astronauta a flutuar entre poeiras e me deitar nos anéis de Saturno para fumar um cigarro. Como se os meus inúteis 18 anos se resumissem apenas em cachaça e espaços vazios num apartamento grande demais para alguém pequeno como eu.
 Entre paredes brancas, entre sofás, entre quadros e poesias. Entre fotografias e desamores. Entre desapegos e mentiras. Entre tudo no que eu poderia simplesmente acreditar e jogar fora, como se não fizesse sentido algum, mas sou covarde. Não posso. Não posso simplesmente me desfazer das coisas como se elas nunca tivessem feito sentido algum. Não posso rabiscar cartas como se palavras fossem descartadas. Não posso ouvir Engenheiros do Hawaii e repetir exatamente a frase de Perfeita Simetria que diz "te chamar de carta fora do baralho, descartar e embaralhar você", até porque eu não vou conseguir fazer você voltar, já que você nunca quis ficar. Então eu vou continuar fumando, esperando por qualquer coisa que possa me satisfazer.
 Talvez agora eu me pergunte porque me preocupo tanto com essas pilulas. Com esse meu mundinho matematico de merda que não me leva a nada. Com esse sentimentalismo babaca que eu tento aprender. Essas coisas estranhas que acontecem de algo tão vazio quanto eu. Preenchido apenas por orgãos que me mantem viva, de resto sobra espaço. Espaço pra tanta coisa, menos pra me permitir algo a mais e acabo me sentindo como um buraco negro.
 Gosto de andar sozinha mas também gosto de escrever poesia. Gosto de tanta coisa que até escrevi uma canção pra ela e sou tão orgulhosa que nem ao menos consigo admitir o que se passa. O que é a minha fraqueza, porque detesto me sentir assim.
 Detesto saber que as coisas não passam simplesmente quando você quer e só quando são necessarias. Detesto muito e é assim que as coisas funcionam aqui. Sem nada e sem pressa de chegar a lugar nenhum. Como quem nunca se encontrou e nunca se encontrará.

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