Archive for fevereiro 2012

Uma xícara de café amargo, por favor.

 Talvez eu tenha me deixado levar. Não, não, eu realmente me deixei levar e acho que fui um pouco longe demais.
 Olha, meu bem, hei de ser assim. Não há muito o que eu possa fazer por ter extrapolado a mim mesma sendo que sentada nas mesas daqueles botecos, eu era eu mesma, porque eu tinha muito mas não tinha nada e estava atormentada com os destinos que me acolhiam, depois me atiravam e me guiavam novamente, de olhos brancos e vendados, até os meus limites e até aonde eu sabia que poderia chegar.
 Não estou dizendo nada, minto. Nego que sei mas que não sei e continuo invertendo todas as frases e costurando as minhas rimas para chegar em um ponto final, você faria isso também? Você se atiraria de um abismo e tentaria voar ou você tem medo demais pra chegar lá? Eu teria medo. Eu me afobaria e se eu caísse, eu iria justamente para onde eu vim e continuaria a respirar, mesmo que me deixasse muitas cicatrizes. A maioria delas, expostas e poucas delas, caladas, em miúdos.
 Sei que sei usar metáforas e gosto delas. Gosto de ser poeta e gosto das coisas que me envolvem, gosto do jeito com que lido. Gosto do sal e gosto do açucar, do café amargo e do café adocicado. Talvez nem tanto mas o suficiente para uma madrugada de chuva, depois um vinho barato, daqueles que fazem com que se arrependa no dia seguinte, de todos os erros e de tudo o que foi dito, de tudo o que foi selado.
 Voltamos então para aquela minha velha mania de escrever poemas em lenços de bar manchados de vinho. Um pingo aqui, um pouco lá, dez pra cá, vinte e cinco no outro canto. Depois dezenove mentiras para nos divertir. Damos risada e fingimos que nada aconteceu. Só nos beijamos, transamos e no dia seguinte, não somos mais nada.
 Me diz aonde seus olhos querem enxergar, porque logo atrás de você, eu posso remar e aí ficamos bem. Mas só se você quiser. Somente se quiser. Só você.

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C'est la vie.

 A cidade, vestida em branco pela chuva que a cobre, parece parar no instante em que não resiste a invasão das pequenas gotículas que insistem em cair do céu. De forma rapida, se espalhando por todos os cantos, deixando-a com uma expressão um tanto palida, apagando os horizontes distantes e trazendo para perto, a melancolia de se observar a coreografia que as gotas fazem ao encontrar o vento, tornando-se um só, algo molhado, refrescante e um tanto harmonioso, que cala o povo e continua a convidar a solidão para uma xícara de café durante a tarde.
 A luz dos raios que caem, invade os meus olhos, como flashes de uma maquina fotografica antiga, capturando cada minimo movimento, cada silêncio, cada pestanejada, cada olhar, sem perder um segundo sequer de minha expressão um tanto quanto desonrosa. Ela tenta captar o que há de errado, o que está por trás das minhas palavras, das minhas invenções e dos meus lábios. Não sei. Não vou levar ninguém a lugar algum com esses olhos apagados, que nada sabem, embora eu tente saber.
 Aí aquela minha velha mania de achar que "de-tudo-sei-demais" acaba por se revirar, tornando-se pequenas cinzas levadas ao vento, como se fossem enfeites para as coreografias chuvosas, que são acompanhadas pelo doce som da agua se rebelando contra o solo, depois se fundindo com a terra e levando consigo, todas as magoas de uma alma que se senta na sacada, com um velho charuto, um bigode francês e uma expressão de inglês solitário, que tenta contemplar a paísagem, respondendo em miúdos o que pra ele já foi o suficiente e agora não é mais nada.
 Daí, entende-se então porque eu tenho um velho bigode inglês, leio jornal em francês e fumo um charuto holandês, por isso meus sapatos são largos e marrons, classicos e desbotados. Não tenho olhos azuis não, não tenho muito a oferecer a não ser a minha sabedoria. Tenho cabelos brancos, gosto de whisky barato e escrevo contos sobre aqueles que nunca encontraram o seu lugar no mundo. E gosto de andar, desandar, de perder, de ganhar, de achar e de ler, mas não gosto de ter. Tudo o que se tem, tudo o que se perde, tudo o que se vai, tudo o que se volta e se fosse facil... Eu não seria poeta e nem falaria francês.

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Touro e Escorpião.

 Transbordando sentimentos pelos poros da pele, sinto-me um tanto quanto anestesiada sobre a dor que venho sentindo nos últimos segundos de refúgio. Bem como queira se dizer, que muitas vezes o que se pensa não faz o menor sentido e talvez seja justo apelar para o impulso, por isso eu venho escrevendo tantos contos em papéis de bar em meio a uma madrugada qualquer. Talvez não estivesse somente transpirando minha angústia mas sim, o alcool que corre em minhas veias, aliviando minha dor temporariamente e me trazendo de volta para um estado um tanto agradavel, sem muito o que esperar.
 Olha que engraçado. Nossos signos se complementam. Eu sou de touro e você é de escorpião. Será que isso vai nos levar a algum lugar?
 Não precisa ir muito longe, eu digo, eu quero ir muito longe! Mas se você quiser segurar minha mão, não tenha medo e nem tenha vergonha, porque junto de ti, vou remar. Sério, vou remar. Podemos ir para qualquer lugar que você queira e deixar o tempo pendurado no varal pra poder secar depois de uma longa chuva. De um longo inverno. Tomamos nosso café e seguimos o nosso rumo.
 Digo que seria tudo um pouco mais facil, mas quero mesmo estar com você e se você sentir vontade, pode me dizer o que quer. Estarei aqui. Com tamanha frieza, com tamanha paixão, com tamanha consideração, eu estarei aqui e se você quiser, eu posso te levar em um barquinho bem pequeno para que possamos navegar entre Mercúrio e Vênus, depois paramos em Saturno e nos deitamos sobre seus anéis, não precisamos entender fisica e nem nada. Só precisamos estar juntas.
 Como assim eu quero, meu sincero pedido de estar ao seu lado, pequena.

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Peter Pan.

  As vezes eu queria mesmo acreditar que as nuvens eram de algodão e que o céu era de papel, quando eu insistia em dizer para mim mesma que eu jamais cresceria. Jamais me tornaria adolescente e jamais viveria todos os dramas que eu tenho vivido. Queria eu ser o Peter Pan, o garoto que nunca crescera, teve o gosto de nunca se responsabilizar por nada e voar livremente pela terra do nunca em busca de qualquer aventura que lhe saciasse a vontade incontrolavel de salvar o mundo... Mais uma vez. Mas eu me lembro, não, eu sempre me lembro!
 - Mãe, eu nunca vou crescer! Eu não quero crescer nunca! Eu quero ser como o Peter Pan, quero ser criança pra sempre!
 - E por que você quer ser criança pra sempre?
 - Por que sim! Eu nunca vou crescer.
 Era vergonha de admitir que tinha medo de crescer? Sim, eu tinha medo de ficar sozinha. Sabia que cedo ou tarde, quando meus pais se fossem, eu seria obrigada a enfrentar a realidade de outra forma, sem ninguém, sem ajuda, apenas com a faculdade em que eu tivesse me formado e a profissão que estivesse exercendo, mas eu queria mesmo era ser astronauta, porque quem sabe viajando pelas estrelas, perdesse a noção de tempo e espaço e pudesse, talvez, tirar um cochilo em marte antes de acordar para a realidade novamente.
 E se eu pudesse ser um super herói? Talvez tudo estivesse bem agora, talvez eu não tivesse me arrependido de ter crescido e enfrentado o meu maior medo... Afinal, ninguém quer estar sozinho no final das contas.

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Café da manhã.

 - Hoje tem café.
 - Amargo?
 - Hm, levemente adocicado.
 - Quanto?
 - O suficiente.
 - Certo, mas e se eu quiser mais?
 - Aqui tem açúcar.
 - E se eu não quiser mais?
 - Aqui também não tem açúcar.
 - Tem como amargar?
 - Não.
 - E salgar?
 - Café salgado?
 - É, pode ser.
 - Nunca ouvi falar.
 - Nem eu.
 - Quer o café?
 - Amargo?
 - Levemente adocicado.
 - Como o que?
 - O nosso romance.
 - E você?
 - Eu o que?
 - Levemente adocicada, totalmente amarga ou salgada?

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Infinito.

 Noite escura, noite tensa, noite esquisita com poucas estrelas no céu. A penumbra da lua ainda invadia certas janelas daquelas casas, também escuras, que não davam sinal algum de vida. O mundo todo estava adormecido entre as estrelas do céu e as luzes das ruas das cidades. Ninguém estava alí. Apenas eu. Eu mesma. Que permanecia sentada sobre a grama, que não estava verde mas sim, negra. Banhada com a escuridão toda que ocupava o céu no instante em que meus olhos insistiram em procurar refúgio. Não tinha muito o que se dizer, só que era o suficiente estar alí.
 Ouvi alguns passos pela grama e logo pude ouvir uma voz familiar.
- Não é um pouco tarde para você estar aqui? Digo, tem gente te procurando.
- Hm, não. Estou bem.
- Está bem escuro, não está com medo? - Ela continuou se aproximando e assim que já estava ao meu lado, sentou-se calmamente na grama, como quem não tinha hora para voltar.
- Não tenho medo de escuro. - Disse, sem mover os olhos que continuavam perdidos na imensidão daquela escuridão que parecia ser infinita.
- Tudo bem. - Calmamente, passou a observar junto a mim, a imensidão sem fim.
- O que você tá fazendo aqui?
- Não acho que esteja muito interessada em saber.
- Na verdade, estou sim. - Dessa vez, meus olhos foram ao encontro dos teus, que, por mais escuros que sejam, refletiam nitidamente a lua lá em cima, como se fossem espelhos, que roubavam aquele brilho todo.
- Acho que me cansei do que estava ocorrendo por lá e decidi vir ao seu encontro. Está encomodada com a minha presença?
- É, um pouco. Talvez devessemos nos calar. - Ela sorriu ao ouvir isso. Incrivel, mas ela sorriu e calou-se de fato, sem nem reclamar, sem retrucar e nem nada. Era uma garota maravilhosa, que prendia toda a minha atenção naquele rosto tão delicado, naquele sorriso tão feminino e naquela expressão de quem não devia nada a ninguém. Ela não precisava de uma beleza excepcional e nem de olhos verdes, afinal, os olhos castanhos dela combinavam perfeitamente com o seus cabelos, ondulados, que desciam seu corpo como uma cascata que cai prazerosa, deixando seu rastro por todo lugar aonde passa, como o cheiro dela. Talvez... Algum perfume qualquer mas não. O cheiro dela realmente me chamava a atenção também. Gostava até mesmo do all star branco dela, de cano médio, que combinava perfeitamente com aquela sua roupa, nada tão chamativo, mas que caía perfeitamente bem naquele corpo maravilhoso que ela tinha. Não sei o que havia de errado, o que havia de proibido, mas era maravilhoso o jeito com que ela absorvia a penumbra da lua, que invadia o seu corpo sem pedir permissão e ela deixava. Ela apenas deixava.
 Então, depois de tanto silêncio, a noite passou a esfriar cada vez mais, ela continuava ao meu lado e eu continuava com os olhos fixos, procurando algo que parecia não me satisfazer e tudo continuava, do mesmo jeito, no mesmo ritmo, até que as estrelas foram dando espaço e o céu imenso pareceu crescer mais um tanto. A lua passou se aproximar e enquanto aquelas vozes que vinham junto ao vento, insistiam em sussurrar desgraças em meu ouvido, senti os braços dela me envolvendo lentamente, não tirei meus olhos de lá, mas levei uma de minhas mãos até a cintura dela e envolvi-a, puxando-a delicadamente para mais perto de mim, ela fechou os olhos e passou a me apertar mais em seus braços, seus lábios se tornaram um só, enquanto encostava sua cabeça em meu ombro, procurando conforto, procurando palavras.
 - Então é assim? Eu vou me apaixonar e as coisas vão ficar assim?
 Ela não respondeu, continuou em silêncio enquanto me apertava um pouco mais e quando percebi, já estavamos abraçadas no meio da noite, perdidas nas gramas escuras de uma madrugada qualquer, perto de alcançar o infinito dos céus, o qual eu queria navegar. Lentamente. Para encontrar outro sorriso como o dela.
 - Obrigada. Obrigada por me deixar te amar. - Sussurrei enquanto beijava o topo de sua cabeça e inspirava, com delicadeza, o cheiro de seus cabelos ondulados e castanhos, lindos como seus olhos e ela sorriu, novamente... Aquele sorriso, aquela noite...
 "She was the one to hold me the night the sky fell down."
 Então, a imensidão toda nos envolveu e quando o céu veio a desmoronar sobre nossos olhos. Sorrimos. Porque estavamos ali, porque estavamos juntas, porque ela era a unica que havia me abraçado na noite em que o céu se despedaçou.

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Tarde de domingo.

 Tarde comum de domingo, aonde sento-me na sala, observo as nuvens lá fora e ouço meus pais comentando calmamente sobre o assassinato de uma jovem.
 "Banal." É, é exatamente isso que eu penso. Banal. Agora parece tão comum. Todo mundo mata todo mundo e ninguém nem sente medo, ninguém pensa, ninguém faz nada, ninguém respira e começa a ser sufocante. A notícia se espalha, chocando a toda população e as pessoas passam a sentir "pena" da moça que fora assassinada com tamanha crueldade. Sério, o que há de errado com vocês? Isso não é nada banal mas a pessoas tratam como se fosse tal, porque quando alguém decide machucar algum animal e isso vai a conhecimento publico, todos ficam inconformados, querem justiça e etc. Que porra é essa, Brasil? Que porra de país você é que não leva NADA a sério? A não ser os banqueiros! Grandes lucradores, esses sim são tratados com respeito mas e a população? Todos aqueles que trabalham dia após dia para movimentar o país! Além de ganhar uma miséria, não ganham respeito por hora extra.
 Sério, eu juro que gostaria de entender o que há de errado com essa sociedade mas existem perguntas que nunca são respondidas e o pior de tudo: nunca tem solução. Afinal, só não tem solução, porque ninguém quer.

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