Archive for novembro 2012

Vinte e dois anos.

 Teve um dia que eu quis faltar no trabalho, mandar o meu chefe ir a puta que pariu, dizer a secretaria que ela era uma gostosa e que de vez em quando, eu batia punheta pensando nela, dizer pro cara do escritório ao lado que eu já o vi cheirando pó e que sua mulher me pagou um boquete depois daquela festa de casamento da nossa querida colega, que eu também já comi.
 Agora que eu narrei estes importantes fatos da minha vida, você deve estar pensando que sou um fodedor de primeira, pegador e que provavelmente tenho várias mulheres me querendo e não vou dizer que estão errados. Fodo sempre que posso e consigo. Fodo todas. Não me importo se são feias, se são travestis, se são viados, eu como o cú e não deixo passar. Eu não me importo com mais nada. Tem muito tempo que parei de me importar com as coisas e a causa de tudo isso, fora uma vergonha para mim na época, mas só agora eu pude entender o seu real valor entre as estúpidas coisas da minha vida inútil... Não vou me perdoar.
 Eu tinha 22 anos, cursava medicina, era bonitão e solteiro. As garotas viviam em cima de mim e eu pegava todas elas, até que me apaixonei por uma caloura de psicologia que tinha por volta de uns 16 anos. Sim, 16 anos e cursava psicologia na universidade federal. Todos achavam o máximo, porque ela era realmente genial e linda. Linda como eu nunca tinha visto antes. Tão linda quanto as viagens que eu havia feito. Tão linda quanto todas as mulheres que eu tinha pegado e, de fato, era a mais linda de todas dalí.
 Seu nome? Talita. Talita, Talita, Talita... Talita que rima com Rita, Talita que rima com as minhas canções, Talita, doce Talita, pequena Talita... Não me canso de repetir esse maldito nome que me fez descobrir que eu havia encontrado uma razão para ser menos babaca do que eu era.
 Talita tinha cabelos longos, escuros e olhos verdes como um par de esmeraldas... Não sabia muito bem o que encontrar alí, sempre fora um mistério para mim. Tinha um sorriso branco como as nuvens e mãos tão leves quanto a sensação de flutuar na agua salgada do grande e imenso mar azul, o qual parecia insignificante perto da beleza quase que irreal dessa garota.
 Começamos a nos encontrar um tempo depois que fui apresentado para ela. Ela acreditava nas minhas mentiras e eu acreditava nas verdades dela, mas por um segundo ou dois, não me arrependo de nada. Pensava eu que seria no máximo seria mais algum dinheiro gasto em bebidas para que eu pudesse leva-la pra cama e como outra qualquer, uma pagina virada no meu livro mas para minha infelicidade... Talita virou o jogo.
 Jogamos e jogamos, várias e várias vezes e depois de ter feito ela se render, consegui a minha maldita transa e tenho dito que foi o dia mais infeliz da minha vida...
 Quando terminamos, ela colocou suas roupas, indiferente enquanto eu observava aquele corpo tão lindo e suado, brilhando a luz daquela lua amarelada que estava lá fora. Ela se virou e com aqueles olhos verdes, me encarou e sem nada a declarar, partiu.
 Não me importei muito, deixei ela ir. Talita era esse tipo de garota, mas no dia seguinte... Ela não estava lá para eu contar vantagem. Ela nunca mais esteve lá. Eu nunca soube realmente o que aconteceu no final das contas, até perguntar para uma colega sua, a qual também tinha sido uma vitima minha entre quatro paredes.
 - Sabe da Talita?
 - Ah... Hm. - Se deitou de bruços e suspirou. - Pensei que você soubesse.
 - Soubesse o que?
 - Ela desistiu da faculdade.
 - Como assim?
 - Ela desistiu. Disse que não era o que queria.
 - Ela não saiu por minha causa né? - Eu era tão egoísta que acreditava nisso mesmo.
 - Vai saber!
 Depois dessa noite de transa, eu decidi que iria procurar Talita e descobrir o motivo pelo qual ela havia desistido de cursar psicologia... Mas nunca pensei que fosse me arrepender e que fosse me importar com ela a tal ponto de andar tanto para encontrar com aquelas esmeraldas novamente... Se bem que nem eu mesmo sabia o que eu sentia. Eu realmente nunca soube.
 Andei muito pela cidade até encontrar a casa de Talita, afinal, a informação rolava solta com aquelas veteranas fofoqueiras que ela tinha... Então, quando toquei a campainha, a mesma me atendera com aqueles olhos verdes receptivos, mas que dessa vez, pareciam frios. Muito frios. Eu nunca havia sentido aquela coisa estranha antes. Sentia algo engraçado no estomago e uma péssima sensação por ver que ela me fitava com tanta frieza, eu esperava mais... Eu esperava muito mais daqueles olhos, do mesmo jeito que ela me olhava na noite em que eu finalmente, pude me aproveitar de cada parte de seu pequeno corpo.
 - Encontrei você. Não vim aqui com o intuito de ficar te pedindo nada, mas só queria saber porque você não está mais indo a faculdade.
 - E desde quando isso diz respeito a você?
 - Pensei que você tinha se apaixonado depois daquela transa.
 - Eu não me apaixono. Por ninguém. Muito menos por você. Foi só uma transa.
 - Bom, pra mim foi algo a mais.
 - Você diz isso pra todas? Elas acreditam mesmo?
 - É sério! Eu quero ficar com você! Se eu não ligasse, eu não teria vindo aqui.
 - Veio porque quis, ninguém te pediu... Ou pediu? Pagaram quanto?
 - Eu sinto coisas estranhas perto de você, mas depois daquele sexo, eu não consigo mais parar pra pensar em outra coisa. - Mas no momento em que eu dizia essas coisas que pareciam ser sem sentido pra mim, mas que eram do fundo do meu coração estúpido, vi outro homem andando e vindo em nossa direção e com uma expressão séria, perguntou:
 - Quem é?
 - Um amigo da faculdade.
 - Eu já disse que não gosto desses seus amigos, Talita.
 - Eu sei, querido, já estou mandando ele ir embora. - Querido? Isso eu não entendi.
 - Tudo bem, vou esperar lá na sala.
 E então, aquele cara que mais parecia um monstro, saiu, deixando-nos a sós novamente.
 - Eu sou casada. Não quero saber de você. Foi só sexo e se eu não vou mais a faculdade, isso é problema meu.
 - Casada? Mas você só tem 16 anos!
 - Escuta aqui, dá o fora daqui. Não quero saber de você. Você pode até ter sentimentos tolos e infantis por mim, mas você nunca saberá quem eu sou de verdade.
 Com uma agilidade quase que incomum, ela fechou a porta na minha cara enquanto eu fitava aquela madeira, tentando entender o que realmente havia acontecido... Ela era casada? Como assim? Eu... Eu... Eu não entendia. Não mesmo. E como se já não bastasse, passei a visitar sua casa todas as madrugadas e descobri que ela também já era mãe e que aquele grotesco era marido dela. Ela apanhava daquele filho da puta mas parecia estar feliz, porque seus olhos verdes brilhavam toda vez que encontravam os olhos vesgos e esbugalhados daquele maldito e eu... Com olhos castanhos e tristonhos, pela primeira vez na vida, senti uma dor anormal que quase me mata até hoje...
 Frequentei bares, arrumava briga, vomitava por uns becos, larguei a faculdade, comi putas, perdi minha casa, meu carro, minha familia... Perdi Talita... Perdi a única mulher que posso ter pensado um dia em me "casar"... Em dizer "eu te amo" e toda aquela babaquice escrota que todo mundo diz quando está apaixonado, mas isso nunca havia acontecido antes... Não para mim.
 Infelizmente, nesse mesmo dia, bebado e vomitado, resolvi visita-la. Gritei bobagens e mais bobagens na frente de sua janela e sei que ela conseguiu me ver, mas do mesmo jeito que a chuva, senti uma dor  terrível no peito e logo pude perceber que minha camiseta branca, estava com um tom avermelhado, que parecia colori-la cada vez mais... Olhei para o lado e vi aquele desgraçado com algo na mão que parecia ser uma arma e com o que me restava, fui até ele e me atirei sobre seus braços fedorentos, enquanto ele me deixava deslizar lentamente até cair ao chão.
 O filho da puta me deu um tiro, me roubou a mulher que eu amava, que acabou com a minha vida... E eu, filho da puta como ele, amei demais sem saber quem eu amava... Eu, filho da puta como ele, admiti para mim mesmo nos últimos segundos que amei Talita e que mereci cada gota daquela chuva que nem parecia tão gelada mais... E de repente, tudo escureceu, mas eu nunca soube se o dia, enfim, chegou.

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Uma crônica sobre uma tarde entediante de Novembro.

 Já parei pra pensar se deveria ficar simplesmente deitada nessa cama por um dia inteiro e ver as coisas, as pessoas, os carros e a cidade se mover em camera lenta pela janela, ver os repetitivos movimentos do sol durante uma tarde inteira e não pestanejar para não perder um segundo sequer de cada passo dado por essa rua, que poderia me levar para o final da cidade ou para um paraíso qualquer... Um puteiro qualquer.
 Tento porque teimo. Não há caneta que escreva um conto sem uma palavra, sem um sentimento besta ou uma mera ilusão de alguma coisa que pareça ser fácil de se imaginar... Ou que seja impossível, tanto faz, porque no final das contas, o céu azul vai acabar se tornando negro e num piscar de olhos, o dia amanhece novamente, com pequenas pinceladas lilás e um pontinho de azul claro como no fundo dos olhos da menina da padaria... Que pena.
 O cigarro está ao lado, as fotografias na parede são quase irrelevantes... Eu penso em tirar todas elas, em colorir cada pedaço desse quarto com um pedaço de quem já se foi ou de quem está por vir. Pensei em tirar os móveis do lugar, jogar fora a televisão, deitar no chão e com poucos acordes, montar uma simples canção sem pensar em nada. Nada além de nada. Nada além das vozes que lá fora pareciam indicar outra dimensão e eu simplesmente não podia entender. Não entendia nada. Não porque era japonês, nem se fosse chinês ou até mesmo português... Não entendia nada porque não entendia ninguém. Só o violão.
 Mudei a sala, como num pequeno jogo lógico, o quarto se transformou no banheiro, a sala se tornou a cozinha, que se tornou um quarto e quando passava das quatro horas da manhã, já não era mais nada. Não haviam mais peças que se encaixassem em cada buraco daquela cidade que eu observava hoje cedo. Eu quis levantar, apenas pensei em levantar... Mas no final de tudo, eu passei olhando, com grandes intenções os longos passos daquela menina de cabelos encaracolados... Como os de Caetano Veloso.

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