Archive for julho 2013

Dançando tango em um céu com nuvens amareladas

 Ultimamente, eu tenho andado assim. Meio sem saber pra onde, o que procurar, quais palavras utilizar. Abandonei os meus botecos, cigarros, mulheres das quais os nomes, nunca foram realmente gravados em minha mente. Andei olhando por outros olhos a realidade que eu gostaria de ter, ou pelo menos pretendia gostar de ter. Acho que me achei assim, um pouco solitária. Totalmente solitária. Um beco sem saída, sem tangos argentinos, sem bailes de máscaras.
 Estou caminhando em uma corda bamba. Uma corda bamba que liga um oposto ao outro, uma ilha a uma nuvem, da qual eu posso facilmente cair e deslizar pelo belo céu azul coberto por água. Eu devoro a minha fome, o meu medo, as minhas apreensões, decepções com tudo o que está sacramentado em tinta vermelha na minha pele seca e rachada. Eu tenho tudo o que eu não deveria ter. Desmerecedora das pequenas coisas da vida, dos pequenos momentos, das pequenas pétalas azuis que cobrem o meu corpo nesse exato momento.
 Eu deslizo.
 Eu caio.
 Uma curva.
 Direita.
 Esquerda.
 Queda.
 Alguns momentos para eu poder me levantar. Melancolia infinita depois de alcançar as nuvens e flutuar sobre as doces águas do oceano. Ou deveriam ser salgadas?
 No instante em que perdi meus sentidos. No instante em que meus olhos se moveram procurando algo que nunca nem sequer existiu. No instante em que me perguntei o que havia de tão amargo no meu café de segunda-feira. No instante em que você apareceu diante dos meus olhos.
 Eu apaguei.
 Dormi.
 Sonhei.
 Acordei.
 Pedi.
 Mudei.
 E no final de tudo, a razão de ter seu nome cravado em meu livro. Meu livro, meus olhos. Ter sua imagem desenhada em meu corpo, a sua pele tão sensível em sintonia com a minha.
 A solidão que antes existia, que só piorou, que me faz querer tanto ter somente a você. A solidão que eu possuo, a solidão que você desconhece, a solidão que parece ser tão utópica.
 Todas as verdades em caneta vermelha.
 Sangue puro.
 Puro suor.
 Meu nome escrito.
 Seu nome desenhado.
 Sua mão na minha, seu sorriso junto ao meu.
 Sua decisão de estar comigo.
 Amor, é amor?

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Eu disse que tinha medo de rodas gigantes

- Ter medo pra quê? Vamos! O máximo que pode nos acontecer é uma morte terrível e dolorosa. - Um tom de deboche acompanhou suas palavras cruéis. Eu, medroso, com problemas respiratórios, óculos de grau e meio metro de altura, já estava praticamente me atirando em qualquer beco que eu pudesse encontrar. Tinha dito a ela que odiava rodas gigantes, mas tudo o que ela faz é ignorar o que eu digo. Eu odeio altura. Odeio a tosse maldita que começou a me atacar. Eu odeio essa ferrugem.

 - Pare com isso! Vamos subir! Estou animada.
 - Vá sozinha! Não quero ir.
 - Ora! Não seja medroso.
 - Sou medroso, deixe-me em paz!
 - Nada disso. Estamos juntos. Ou vamos ou não vamos.
 - Então não vamos!
 - Ainda não me convenceu!

 E com suas mãos, me puxou pelos pulsos até a entrada da bendita maldita roda gigante. Aquela esfera pelo menos cinquenta vezes maior do que eu fez com que toda a saliva presente em minha boca sumisse rapidamente. Seus suportes estavam tingidos numa cor amarela que me lembrava urina, e suas cadeiras eram azuis. Parecia uma porra de uma roda gigante de patriotas, pois além do mais, possuía pequenos detalhes em verde.
 Na fila quilométrica, haviam crianças de vários tipos. Das mais remelentas e catarrentas até mesmo as mais mimadas e irritantes. A excitação delas era perceptível e eu, por ter quase 30 anos nas costas, já estava me sentindo envergonhado por ter pavor de altura. De rodas gigantes. De uma bosta gigante. É exatamente isso. Mas ela insistia tanto que eu nem poderia dizer. Eu nem poderia contrariar.
 Ao sentar minha bunda naquela ferrugem desgraçada e patriota, a esponja negra que habita meu corpo e que eu carinhosamente chamo de pulmão, passou a reagir. Os cigarros, apesar de serem deliciosos, haviam me deixado um belo presente. Agora eu não conseguia mais me aventurar sem tossir até a morte... Para isso eles valeram, mas não me salvaram de uma maldita roda gigante.

 - Vai ser divertido!
 - Diga por você.
 - Você é tão rabugento... É por isso que não se diverte.
 - Não venha me dar aulas de como me divertir. Eu preferia estar em casa lendo, fumando e bebendo.
 - Sim, se afogando aos poucos na sua própria desgraça. Apenas tente se divertir.

 Com um tranco, aquela coisa já estava rodando. O carrossel ao lado tocava uma música macabra que combinava perfeitamente com o ritmo que meu estômago seguia de descer e subir. Senti um certo sufoco, meus olhos se fixaram nas ferragens cor de qualquer coisa menos de ferro, enquanto a cadeira balançava conforme o ritmo do vento. Eu engolia em seco, ela sorria. A sensação era péssima.
 Depois de chegarmos ao topo, seus dedos me cutucavam para que eu pudesse abrir meus olhos e enxergar a cidade inteira, que estava coberta de poeira pelo clima seco que fazia naquele inverno estranho. Meus olhos se arregalaram quando se depararam com a imensidão que estava abaixo de meus pés. O medo intenso se transformou em uma explosão de sentimentos que eu não pude nem ao menos lidar. A sensação de tê-la segurando minha mão me trouxe para a realidade e pude perceber que afinal de contas, eu nem estava tão perdido assim. As tosses pararam, o efeito de ser uma gelatina humana também acabou. Meus olhos se acalmaram, procurando os olhos dela para poderem se apoiar. No instante em que se encontraram, eu soube que poderia ser diferente. Engoli em seco e soltei sua mão. O medo voltou.

 - Achei que você tinha superado.
 - Não é tão simples assim!
 - Não mesmo?
 - Não.

 Então, seus abraços envolveram o meu pequeno e gélido corpo. Nossas respirações se encontraram, e ela ouvia perfeitamente o som dos batuques do meu coração. Fechei meus olhos e deixei que seu abraço permanecesse assim. Encontrei motivos e razões para fugir, mas eu estava encurralado. Encontrei coisas pra fazer, dias pra contar, horas pra alterar, cartas para escrever, sentimentos para superar.
 No final das contas, quando meus pés tocaram o chão e meus olhos se abriram, a minha surpresa foi maior. Ela ainda estava lá. Eu ainda estava lá. Nós nos olhamos e seus olhos, curiosos e questionadores, esperavam que eu dissesse algo mais produtivo dessa vez. Lhe ofereci o meu melhor sorriso e com dois passos, me levantei da cadeira, ajudando-a a se levantar. Quando caminhamos em direção a nossa casa, ela então quebrou o silêncio.

 - Foi tão ruim assim?
 - Não, nem tanto.
 - E o medo?
 - Ah, eu não sei.

 Ela apenas sorriu. Eu sorri porque soube que naquele instante, ela havia descoberto que no fundo da minha carcaça enferrujada, o medo de rodas gigantes havia sido superado. Agora, elas não pareciam mais me assustar. Seus pedaços de ferro eram apenas uma maneira de explicar que não importa o que aconteça, se ninguém por a cara a tapa por nada, nunca vai aprender a viver. Eu pus por ela, ela continuou sorrindo por confiar plenamente no que eu estava lhe oferecendo. Se vai valer ou não, eu não sei, mas no final, vai doer como se fosse qualquer outra coisa e é assim que funciona... O mundo é uma roda gigante de espinhos, é só saber andar, balançar na hora certa e descer apenas quando seus pés encontrarem o chão. Fugir nunca é a solução.

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