Archive for maio 2012

Nem parnasiano e nem romantico, o rascunho de uma coisa qualquer.

 Não tenho nada pra dizer. Nada mesmo. Tenho um cigarro no cinzeiro, uma vida toda pela frente, um café esfriando na mesa e um sol intenso do lado de fora.
 Uns papéis rasurados jogados no chão pra dizer que eu tentei escrever alguma coisa e olhos fixos na parede branca. Sem nada na cabeça. Sem você e sem eu.
 Já fora dito, outras vezes, que quando o tempo passa assim, não há muito o que se fazer. Não existem maneiras de poder parar e não existem cigarros que possam me acalmar. Não existe um refúgio ou uma lei, não existe pudor ou uma direção certa. Não existe nada além do que seus próprios passos possam andar e eu realmente estou tentando mudar isso.
 Tá certo, tá certo. Eu não to falando nada com nada. Eu não quero chegar a lugar nenhum. Eu não saio do lugar. Eu só fecho as cortinas e espero pela noite que antecede o dia. Ou o dia que antecede a noite. Ou o momento que antecede a sua chegada. Um atraso no aeroporto e duas horas e meia de espera. Um tropeço no portão errado e de repente, você já estava alí. Você já estava alí e eu não sabia de nada. Eu não pensei em nada. Eu só te olhei os olhos e levantei, pra seguir de novo, pra embarcar de novo e acontece que o meu pequeno tropeço resultou em algo inimaginavel.
 Entretanto, para quem vive andando sozinho, fora um tropeço e tanto. Fora o suficiente para que eu pudesse me desplugar desse mundinho escroto e matematico que eu vivo. Formado por pura lógica e quase nada de sentimentalismo. O mundo para o qual eu voltei depois de 3 anos num sufoco que parecia não ter fim. O mundinho que eu tanto gostei porque tudo podia fazer sentido e eu acreditava estar me encontrando, embora sempre estivesse perdida.
 Não sei muito o que fazer. Não sei para onde olhar ou o que simplesmente te dizer. Não sei como agir. Não sei de nada.
 É como se todas as palavras que eu escrevesse se perdessem umas das outras e seus elos fossem cortados por um simples olhar numa manhã chuvosa de Maio. É como se todos os meus contos se tornassem rascunhos sujeitos a toda uma reforma. A todo um sentimentalismo que eu simplesmente não sei lidar. A todo um momento, a todo um abraço, a todo um beijo. A todo lugar.
 E eu simplesmente vou ficar calada.
 Mas se você se perder e pedir para eu te acompanhar, eu vou.
 Segurar a sua mão toda manhã na fila do pão e te beijar o rosto durante todas as noites de verão.
 E te cuidar para sempre ve-la sorrir.

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Kinda lost.

 O que eu estou ignorando? A luz apagada na sala? A agua esquentando no balcão? Os ruídos vindo do quarto no final do corredor? A quem eu estou enganando?
 O que é que eu não quero saber? Não quero mesmo aprender a andar e abrir a porta pra poder saber o que está acontecendo. Não quero lidar. Não quero entender. Não quero voltar a tudo.
 Não quero queimar meus dedos ao toca-la e sentir meus olhos se cobrirem de lágrimas outra vez. Não quero ver as fotografias sendo queimadas pelo isqueiro descontrolado, com faíscas repentinas, ameaçando destruir tudo o que alí já pensei em construir, já pensei em guardar, já pensei em me lembrar. Queria não tentar. Queria não ouvir.
 Queria não gritar e salvar alguém. Queria poder fazer algo mas sou inútil. Queria, tento, mas sempre falho e nunca entendo o que eu tenho de errado. Nunca entendo porque é tudo tão ilógico, porque eu simplesmente não sei lidar com tal situação e descarta-la como se nada tivesse acontecido, porém é quase impossivel de se aprender a lidar com algo da noite pro dia. Eu não quero lidar. Eu não quero aprender.
 Eu vou sentar na sala, vou acender um maldito cigarro e se eu me incendiar, não foi por querer. Vou olhar as paredes brancas no escuro e fingir um sorriso. Vou encostar a cabeça no sofá, fechar os olhos e tentar só por uma vez não deixar aquelas pequenas gotas salgadas escorrerem pelo meu rosto novamente. Vou sentir raiva outra vez. Vou sentir cansaço. Vou fingir que sei para onde estou indo. Vou atirar uma pedra no vidro da porta da sala e vou quebra-la em estilhaços. Vou encontrar o que menos espero e vou me saciar com a minha própria dor.
 No outro dia, serão olheiras. Os carros voltarão a correr nas avenidas movimentadas. As buzinas vão me acordar. O rosto, com marcas transparentes, irá procurar solução. Os lábios vão ficar entreabertos e os olhos fixados em uma imagem que não parece ser minha, mas que sempre fora. Desde quando me conheci. Desde quando me "encontrei", desde quando pensei em me "perder".
 Eu estive tanto tempo perdida que nunca soube disso, nem por um segundo. Só me esqueci de me escrever uma carta e de dizer nela, tudo o que já fora dito das outras vezes. Fingir que vou ler, que vou aprender, que vou assimilar. Fingir que sei de alguma coisa. Fingir que... Senti.

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Armadilha mortal.

 Eu pensei que pudesse, eu pensei que soubesse, eu pensei que passaria e que fugiria. Que tudo haveria de se encontrar e que seus devidos lugares fossem preenchidos com algo a mais que pequenas gotículas salgadas manchadas de preto. Eu pensei que fosse capaz. Pensei demais e calculei errado. As coisas saíram do meu controle.
 Não sei nem o que falar! Não tenho nada pra escrever. Se quer que eu saiba o que eu nunca vou descobrir, então eu prefiro me calar. Não vou falar do que não sei e nem vou arriscar o que eu sei, o que vai resultar no fim de ambos os sorrisos. Sabe-se lá quando eu vou saber lidar com isso, certo? Que eu vou ser o suficiente pra entender todas aquelas coisas que eu nunca quis aprender. Que eu... Que eu sei lá! Que eu possa ao menos criar coragem? Não sei.
 Tem muita coisa não dita por aí. Temos muitos rascunhos amassados e jogados pelo chão. Temos rabiscos e temos algo a mais: Nada. Nós não temos nada. Nada além de rascunhos. De palavras, pequenas, feitas, de verdades que nunca... Nunca descobriremos. Temos medos e temos sentimentos. Ou não temos. Você tem. Eu não quero ter. Só isso.
 Como eu havia pensado, sou uma alma penada. Com um cigarro na boca e a coragem pra me enfiar em qualquer beco que me pareça interessante. Não vou sentir dor, porque há tempos eu sei o que é estar em sua presença. Não vou sorrir porque eu detesto fingir um sorriso que não é meu. Não vou pedir por algo que eu sei que não vou encontrar. Não vou pedir por whisky e nem por cachaça. Não vou pedir por nada.Vou pedir pra me olhar no espelho.
 Não vou bancar o inglês cortejando a mocinha. Não vou bancar o mimico francês, escondido atrás de maquiagens. Já fui mimica por um bom tempo e acho que já está na hora de largar o emprego. Não vou bancar o italiano galã e nem o toureiro espanhol. Não vou bancar porra nenhuma do que não sou. Vou escrever mal, vou errar as palavras, com uma letra ridicula e rabiscada. Vou calar a boca e fingir que vou esperar por alguma coisa, a qual nunca vai acontecer. Só não vou fingir que sorrio tanto.
 Que alegria maldita, não? Contagiante que pra porra nenhuma que eu saiba, eu preciso fazer o que faço. E as cortinas continuam fechadas.
 E ainda me perguntam se eu tenho duvidas de que esse quarto sempre estará vazio.

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Pequeno relógio.

 O tempo tá voando. Olhei a minha volta e me perguntei se poderia sorrir. Os carros corriam na avenida em movimento ritmado, enquanto eu esperava a noite calar as últimas vozes daquele lugar. Cigarro no cinzeiro, fumaça no rosto.
 Revolução industrial.
 Salas vazias e radio ligado. A voz anunciava a data e as músicas.
 As mãos, suadas, com os dedos grossos e calejados entrelaçados.
 O chapéu que estreitava a visão e fazia sombra.
 1931 e vinte e dois anos. Juventude perdida em becos escuros no suburbio daquela cidade.
 Inverno e suor, esperança e morte.
 A saudade participava também.
 Copo na mesa, pensamentos distantes e dedos que agora se desprendiam lentamente.
 Se apoiaram no balcão de madeira e batiam suas pontas em um compasso quase perfeito. O barulho imperceptivel ignorado por algumas vozes ao fundo.
 Lábios aflitos e resscados.
 As marcas de suor no balcão e mãos que voltavam a se encontrar.
 Agonia e sufoco, gravata apertada, sobretudo pesado, calças surradas e sapatos manchados.
 Vinho. Muito vinho.
 Cinzas no cinzeiro, cigarro apagado e o isqueiro em chamas para mais um.
 Um trago a mais, um suspiro e um rabisco imaginario.
 Olhos se fechando, madrugada chegando, portas se abrindo e passos na neve.
 A arma no bolso esquerdo, gelada, mãos protegidas por luvas e pernas embriagadas.
 As palavras caladas, a agonia de viver sozinho e a vontade de pedir... Pedir algo, pedir arrego e suplicar por algo que talvez eu soubesse o que significava.
 Nunca pensei que fosse querer.
 Talvez dessa vez ou numa outra vida, num outro sapato coberto de neve e num chapéu panamá preto e cabelos...Cabelos... Deixa pra lá.

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Gotas de chuva.

 De dois a dez, eu prefiro quinze. De vinte gotas, eu sou aquela que escorre pela parede branca e se duvidar, eu formo poças. Porque gosto de congestionar, crescer e aglomerar, mesmo que a chuva passe e o sol volte a brilhar, secando as mais fracas, eu continuo lá e hei de crer que vai passar.
 De um a vinte, eu gosto das quatro. Porque o meu crepusculo é lilas, mas eu não gosto de cores, porque sou transparente, mas quando anoitece, eu me camuflo com algo bem parecido comigo. Só é salgada, porém, juntas, somos neutras. Porque ela é pequena e eu sou grande. Ela é minha e eu cuido dela. Mesmo que suma na manhã seguinte, ela sempre dá um jeito de voltar durante a noite. Não importa se esteja frio ou se esteja calor, se é primavera ou se é outono, se não chove. Ela sempre acaba por voltar.

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Para uma pequena.

 Conheci uma pequena há uns dois anos atrás. Cabelos castanhos, curtos, lisos e um sorriso de outro mundo. Meiga, dos olhos pequenos e uma expressão unica de quem queria andar com os próprios pés em cima das nuvens de algodão que enfeitavam o céu naquela tarde de Setembro e eu ainda consigo me lembrar melhor do que nunca, só não imaginava que aquela pequena ocuparia um espaço tão grande em um lugar quase inimaginavel que se encontrava dentro de um ser tão vazio.
 O tempo foi passando, conforme o vento vai e nada lhe impede. As coisas foram mudando, os sorriso eram outros e seus passos foram levando-a para onde deveria estar, pelo menos por enquanto, mas voltara. Voltara para ficar dessa vez. A pequena menina que queria tanto ter um all star azul e que gostava de ouvir Paramore toda vez que tinha essa oportunidade, que também sempre se preocupou com seus amigos e nunca lhes deixou quando mais precisaram. A pequena menina que conquistou a todos ao seu redor. A pequena menina que tem sonhos, que é meiga e jura não ter sentimentos. A pequena menina que ainda vai andar descalça pelas nuvens e tirar um cochilo, apenas quando a lua chegar, já que prefere a noite. A pequena menina do sorriso contagiante e que apesar da sua altura, tem um coração maior. A pequena menina das blusas xadrez e do futuro all star azul.
 Não há muito o que se dizer sobre ela. É uma pequena que quer se aventurar pela vida, devorar livros e mergulhar numa tempestade, para nunca mais se afobar.
 Andando devagar para logo chegar lá, sem medo, sem fechar os olhos. Com seus passos curtos em direção a algum lugar que talvez ela queira descobrir. Algum lugar que talvez já saiba e talvez pense em descobrir um pouco mais.
 E o que o vento a leve! Devagar, como uma folha seca. Mas que a leve com cuidado para não tropeçar. E que essa pequena nunca cresça tanto quanto seu coração e que esteja sempre em meus olhos para que não a perca de vista, porque ainda a acompanharei quando me pedir e não deixarei com que o vento a leve para longe de onde queira ir.

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Vida. (Por: Laura Marques e Nathasha Ariadny)

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Adeus, cabelos vermelhos.

"Ei, eu tenho muito a dizer.
 Eu penso sobre isso todos os dias.
 Como explicar tudo o que eu senti por você.
 Me desculpe por tudo o que eu fiz.
 Me desculpe por todas as besteiras que eu disse. Me desculpe.
 Eu pensei que precisasse mesmo de ti mais do que qualquer coisa
 Mas eu me enganei e agora sei
 Que posso aguentar isso sozinha e que ficarei bem.

 Eu vi você partir milhares de vezes.
 Chorei por ti por noites e noites.
 Agora estou bem, agora são apenas memórias.
 Nosso passado lembra-me que meus sentimentos não foram reais.
 Você sempre desistiu de nós quando quis.
 E eu tentei demais lhe fazer sorrir.
 Mas eu não poderia, você não me deixaria entrar.
 Você só me jogou para fora de novo e de novo.

 Nossas fotografias, nossas cartas e nossos verões.
 Falando sobre coisas estúpidas até as três da manhã.
 E agora é hora de dizer todas aquelas palavras.
 Que eu nunca pude dizer, porque costumavam me matar.
 Elas costumavam me matar.
 Adeus, cabelos vermelhos. Adeus!
 Adeus, cabelos vermelhos, para todo o sempre.
 Adeus."

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De rascunhos a roteiros.

 Minha vida é uma confusão. Cê sempre soube disso não? Acho que sempre soube sim. Cê sempre esteve lá, mesmo não muito perto, mas estava lá pra ver a minha desgraça diaria. Fumando um cigarro ou dois, com os lábios colados e os olhos verdes tão atentos que nem os meus poderiam perceber os minimos detalhes que talvez você visse e como eu sempre deixei passar, não me importei. De novo.
 Depois de muito, a gente meio que foi se percebendo uma na outra. Era um bocado esquisito né? Te chamar pra sair ou até mesmo te ligar sem nenhum motivo aparente apenas para fazer gracinha ou finalmente dizer que eu te achava especial, coisa do tipo, coisas que não precisam fazer sentido depois de uma noite chuvosa cheia de relampagos. Palavras que talvez mudariam tudo se não fossem ditas, vinhos que seriam jogados fora antes mesmo de eu lhe dizer todas aquelas coisas que eu sempre gostei de dizer. Rascunhos transformados em roteiros e dias que se transformaram em meses, justamente porque você estava longe. Justamente porque te quis. Porque arrisquei.
 Daí eu quis tentar, dei tudo de mim, realmente gostei. Paguei as flores e todas as coisas clichês de sempre e levei-as até você, segurei sua mão e quis te levar para onde a maré nos quisesse guiar. Talvez se fosse tarde ou se fosse manhã, mas estariamos alí e eu te seguraria para nunca deixar cair de meus braços tudo aquilo que parecia ser meu mundo por um instante e se foi no próximo segundo em que resolvi pestanejar e lá estava eu, sozinha de novo, no meio do mar, um pouco perdida, talvez. Não sei. Voltei pra casa o mais rapido possivel antes que pudesse chover e cheguei a tempo.
 Mas sabe de uma coisa? Eu gostava bem mais de você quando você era minha. Agora? Tanto faz.
 Você mudou como quem rasga todo o roteiro e fica só com o rascunho, talvez por isso eu nem queira mais entender.

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Televisão, cerveja e quarta-feira.

 Sorriso irônico estampado na cara depois de se dar por vencida. Três potes e meio, meias verdades lacradas pra que não corra o risco de fugirem depois. Nem quando a madrugada resolver chegar, nem quando o dia quiser amanhecer ou nem quando aquela voz resmungar as mesmas frases feitas depois de um dia fora. As luzes da casa apagadas e um suspiro aliviado vindo da sala. Essa sou eu.
 Pernas esticadas, lata de cerveja na mão em plena quarta-feira, cara de tédio pra televisão porque eu detesto assisti-la. Não tenho paciência. O controle na mão esquerda, mudando de canais como se por um milagre, fosse aparecer algo que realmente me interessava. Televisão não me prende. Televisão me entendia. Televisão é um porre e eu odeio a globo. Desliguei-a e continuei dando leves goles na minha cerveja. Quem me olha assim, jura de pés juntos que tenho uma vida ótima e que não preciso de mais nada.
 Levanto-me rapidamente em busca de alguma solução, vou até a cozinha e bebo um copo de suco de laranja. Daqueles de caixinha, porque dá menos trabalho e já vem pronto. Haja paciência pra ficar fazendo suco, eu definitivamente não sou dessas. Jogo fora a latinha de cerveja e me pergunto porque tomei suco com cerveja. Logo resolvo deixar quieto e vou pra sacada. Dou aquele meu sorriso ironico de sempre, derrota estampada na face e um metro e meio de mentiras descaradas.
 Quem sou eu?

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Pós-modernismo.

 De nove a dez, João gostava de onze, porque era impar e porque era do contra. João era solteiro. João vivia sozinho e trabalhava num escritório, aonde saía as onze da noite e passava no supermercado pra comprar salsicha enlatada, porque João não tinha tempo de cozinhar.
 João tinha duas tatuagens e uma delas é um rabisco na nadega esquerda, porque não quis terminar. João era romantico e poeta, João assistia a novela das oito e sonhava em ser galã da globo só pra namorar a loira gostosa do comercial de cerveja e jogar na cara da sua ex-namorada que arranjaria coisa melhor.
 João só usa microondas, porque é pós-moderno. Gosta de ler veja e fazer testes na internet nas horas vagas. Também gosta muito de estudar os seus colegas. João é um cara discreto que sabe do caso do seu patrão com a secretária que por uma ironia do destino, senta-se ao lado dele e fofoca com a amiga no telefone durante o horário de trabalho. João ignora porque João não se importa.
 João não ri, João não chora, João não reclama, João não fala. João gosta beber cerveja e finge que gosta de futebol, porque os amigos todos adoram. João finge ser palmeirense. João não entende nada de futebol. João só entende que há prioridades (depois das onze) quando se tem um emprego. João também não gosta de namorar.
 João já foi casado com Maria, que na noite de núpcias fugiu com José, que agora é dono de todo o mercadinho do seu Zézão, alí na rua debaixo. João nunca entendeu. João e Maria nunca se entenderam. Maria nunca nem voltou pra devolver os 10 reais do cinema naquela tarde de quinta-feira, quando se conheceram. Nem voltou pra agradecer. Maria fugiu e engravidou.
 João já quis cometer suicidio. João já quis se sentir europeu. João tentou ser culto. Mas abandonou tudo pra resolver um teste sobre signos que acabara de aparecer no google. João é da época da internet. João é pós-moderno.
 Também já quis ser anarquista, comunista, mas deixou de ser tolo. Gostava de comprar. Revistas. Só de palavras cruzadas, mas gostava de comprar. João decidiu aceitar sua posição como capitalista. João reclama de política sentado na poltrona da sala. João resmunga porque não fala. João não é mudo. Só não fala.
 João acorda as onze e trabalha até as onze, porque gosta das onze. João não tem carro e pega o 311. João diz gostar de frio mas mora no calor. João é pós-moderno. João é brasileiro. João é reclamão.
 Joga o jornal fora e não fuma maconha, porque faz mal. Mas João fumava. João só gosta das onze.
 João é pós-moderno.

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Uma pequena reflexão.

 Teus olhos, teus abraços e uma taça de vinho pela metade em cima da prateleira de vidro. Um papel rabiscado com um recado de uma data já antiga, minha assinatura nele e mais algumas pequenas palavras rasuradas no verso que você nem se deu o trabalho de tentar decifrar. O cigarro que você tanto odeia no cinzeiro da mesa e meus olhos secos pregados num mesmo canto por horas e horas, acompanhados por um cansaço quase infinito de se viver daquela forma. Todos os dias e sempre a mesma história.
 Tuas mãos, teus laços, teus sorrisos que não são meus. Teu corpo e teus cabelos longos que coloriam as paredes brancas desse apartamento com cores vivas que você mesma nem via... E me deixava só, como quem andava de olhos fechados, sem medo de se perder, sem medo de alcançar, sem medo de nada... Eu tinha de sobra e você nem via! Você nem vê.
 Teus passos pelo chão, as pegadas da noite anterior e do teu cafuné nos meus cabelos cansados, dos meus olhos fitando os teus e você sempre a sorrir. Também nem via o que eu via, também não sentia o que eu sentia e nem imaginaria os tantos rascunhos de meus dias nublados que procuravam abrigo debaixo do teu abraço seguro e protetor, sem que você notasse que meus olhos junto aos teus, parecem crer em algo além da realidade monótona e sem cor alguma. Assim como as paredes do meu quarto.
 Mas quando pisco os olhos, devagar e vejo todas as paredes brancas que estão a minha volta, dou um longo suspiro e volto a minha realidade, rasgo a folha de papel, retiro a taça da prateleira, apago o cigarro inútil a minha dor. Passo a mão pelos olhos, esfrego-os e lembro-me de que já está quase na hora de ir.
 Existem coisas que são melhores se nunca forem ditas.

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Pierrot pós-moderno.

 Como um palhaço cansado, sentado no chão empoeirado com um marlboro red na boca e o suor escorrendo pelos poros maquiados do rosto até então coberto por sorrisos, expressões hilárias e um pouquinho de irônia.
 As luzes apagadas, papéis jogados ao chão, silêncio quase impenetravel e apenas uma brasa, pequena, iluminava o que parecia ser um pouco da esperança que restava àquele ser que não tinha mais nada. Nem os sapatos tão grandes assim, nem as calças coloridas e engraçadas, nem a capacidade de arrancar risadas com tanta facilidade. Já fizera isso antes. Tantas vezes sem nem saber aonde iria chegar.
  Agora, tinha as mãos cobertas por cicatrizes e queimaduras, protegidas por uma luva laranja, que lhe lembrava o por-do-sol, que lhe lembrava... Deixa pra lá. Lhe lembrava coisas demais. Lágrimas e suor e talvez um pouco de cachaça pra amenizar a dor que sentia. Ele sabia. Era como o Pierrot que implorava pelo amor da Colombina, que lhe tornava os traços de palhaço nos traços de um bebado equilibrista, que a todo instante, caía e se feria ao som aplausos daquela platéia tão calorosa e tão gigantesca, comemorando a sua miséria e melancolia, escondidas nas maquiagens fortes, nas sombras pretas e nas cicatrizes de lápis em cada um deles. Uma platéia de Pierrots e um deles, era eu. Circo de lágrimas, trapezistas e suas manobras sobre os sintomas, as palavras, as flores, a música macabra e todos os rastros de maquiagem deixados pelo chão que manchavam o seu sapato velho.
 Muitas vezes, ao fim de cada espetaculo do circo de Pierrots, via-se longos rastros de maquiagem que se perdiam em direções distintas, como quem levaria algo a alguem, como quem se livra dos piores medos possíveis, como um Pierrot que finalmente deixou de amar sua Colombina. Infelizmente, nenhum Pierrot deixa de ser Pierrot, as Colombinas sempre existirão e os Arlequins também, tomando os doces sorrisos das Colombinas.
 Do outro lado da rua, o circo dos Arlequins e a sua esquerda, o circo das Colombinas e do lado de cá, circo dos Pierrots, que sentam no chão pra fumar um cigarro enquanto os espetaculos a luzes coloridas continuam por uma noite inteira. Marlboro red e Pierrots. Milhares de Pierrots. Como eu. Um eterno Pierrot.

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Por uma noite de verão e cinco meses de sufoco.

 Quem diria, hein? Que uma noite de verão pudesse simplesmente fazer com que meus olhos passassem por você sem nem ao menos perceber que naquele tempo todo em que eu sempre estive perdida em outros cantos, eu nunca havia reparado que... Existia você alí. Apesar de saber. Ou não saber. Ou simplesmente nunca me convencer de que eu nem quis pagar pra ver que você iria se tornar muito mais do que poderia pensar em ser.
 Muita coisa aconteceu. Nem me lembrava mais. As noites de verão era normais e com um cigarro e meio na beira da praia, eu passava entediada, contando as horas pra voltar pra casa e finalmente pensar que daria um rumo certo na minha vida. Dá pra entender? Não, nem eu entendo. Mas quando eu cheguei... Ah, quando eu cheguei.... Eu te vi. De novo.
 Então o destino te trouxe de volta, certo? O tempo te jogou no meu barquinho de papel como uma tempestade que provoca as marés calmas de um oceano quase infinito e aí... Bem, aí o meu barquinho se perdeu. Ele se perdeu porque você apareceu. E eu nunca vi. De novo. Engano meu.
 De braços cruzados, eu te observava como quem quer preencher o vazio tão permanente e você me olhava. Me olhava... Sei lá, você só me olhava. Eu só não sabia porque e nem da onde você veio, nem sei como você surgiu ou porque você resolveu me fazer perder o rumo, porque quando pestanejei e finalmente abri os olhos, você ainda estava lá. Sim. Bem na minha frente e eu ainda não sabia dizer o que estava se passando. Podia ser engraçado, pois a expressão confusa estampada na minha face era quase impossivel de não se perceber e todos me diziam alguma coisa do tipo, me perguntavam o que eu estava fazendo e aonde eu pretendia chegar.
 Sei lá, porra, se eu pretendesse chegar a algum lugar, eu nem me atreveria a sorrir pra você. Eu nem sabia aonde eu iria parar, aonde você iria me levar, eu nem sabia que todo aquele momento pudesse se diferenciar dalí pra frente e que eu me perderia nessa tempestade inteira só por ter te olhado melhor. Só porque eu quis reparar. Só porque dessa vez, eu tive que reparar. Só porque... Só porque é você e aí as coisas ficam bem depois de um tempo.
 Mas se estiver me ouvindo, ligue o farol e me guie. A tempestade é intensa, você caiu aqui e eu preciso que apenas você me tire desse sufoco, antes que todo o meu barquinho se desfaça e eu tenha que nadar. Me guie. Seja o meu farol, o meu porto e eu serei o seu barco. A te levar pra onde quiser, pra onde pedir, pra onde desejar, sem rumo e sem hora pra voltar.

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O que te faz feliz?

 Quem te faz feliz ou o que te faz feliz? Julga por isso ou simplesmente pelo que sente, digo, pelo que é capaz de sentir? Não sei ao certo como isso veio parar em minha cabeça. Não sei se você é o tipo de pessoa que julga pelo que poderia sentir, pelo que vai te proporcionar boas sensações ou se simplesmente iria dar ouvidos ao que dizem por aí. Se você seria capaz de sentir algo por alguém igual a você, digo, biológicamente falando ou se você fugiria disso, porque é "errado" ou porque é "estranho".
 Será? Será que você se encomodaria se eu te dissesse que eu faria de tudo pra te ver bem? E que gostaria de estar sempre perto de você, lhe proporcionando algo de bom? Lhe pagando uma cerveja, de preferencia, a sua predileta, dando risada e contando-lhe piadas mas ao mesmo tempo contemplando momentos únicos? Talvez você não gostasse de ouvir isso e se afastasse, talvez isso te assustasse. Talvez você nunca quisesse, talvez você tenha nojo, talvez... Tantos talvez que eu acabo me perdendo. Não sei, não sei.
 Tenho medo. Sim, tenho medo. Medo de pedir pra te acompanhar quando penso na possibilidade de você me rejeitar, porque afinal de contas, eu tenho certeza que eu não sou o que você quer, certo? Tenho o que eu julgo bom pra mim, tenho o que é ruim também (e de sobra), mas gostaria de tentar fazer com que valesse a pena, com que você se sentisse especial e com que você pudesse dar gargalhadas toda vez que eu lhe contasse uma piada idiota.
 Tenho vontade de segurar a sua mão e te levar por aí. Pedir pra te acompanhar. Te beijar de forma intensa e não ter vergonha de demonstrar o que realmente sou. Cuidar dos teus medos. Dos teus braços tão quentes e do teu sorriso tão diferente e que começa a fazer sentido quando as coisas ficam em torno de nós. Não sei como se sente. Não sei nem o que dizer. Nem o que sentir. É tanta coisa que me deixa confusa, tô tropeçando na vida de novo e acho que não quero cair, só se você me segurar.
 Embora tenhamos lá nossas diferenças e você realmente não queira que eu faça por ti o mesmo que você faz por mim (causa toda essa sensação estranha no estomago, nervosismo desnecessario e um bem danado toda vez que me abraça), eu me importo e não quero que ninguém tente te fazer tropeçar, mas se você cair, eu lhe seguro. Te abraço se quiser e se me pedir, eu te faço feliz. Mesmo não sendo o que você quer. Eu tento.

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Se fosse real...

 Quanto tempo faz que a gente não se fala. Quanto tempo faz que tudo o que a gente chamava de "eterno" acabou... Quanto tempo faz que você se foi e eu me reergui em meus próprios passos. Quanto tempo faz que eu fumo esse mesmo cigarro e ainda te ouço reclamar, porque você detesta o gosto que ele tem. Quanto tempo faz que a gente se abraçou e você disse que não queria ir embora no dia seguinte. Quanto tempo faz desde que eu te prometi que nunca iria deixar você de lado. Quanto tempo faz que eu fui embora e você nem sequer me procurou. Quanto tempo faz que as nossas mentiras foram se tornando inúteis e indiferentes. Quanto tempo faz que eu deixei de acreditar que existia um "pra sempre". Quanto tempo faz que a gente não se vê. Quanto tempo faz que eu não ouço mais a sua voz ecoando em minha mente, me pedindo para parar todas as vezes em que brigavamos. Quanto tempo faz que eu não sinto mais a sua falta. Quanto tempo...
 Ainda sim, depois de tudo, me lembro do que prometemos. Do quanto eramos ingenuas e acreditavamos que existia sim um eterno, que o amor era preciso, que era sede de aprender e viver, que era algo nosso e que o mundo nunca nos entenderia. Tantas coisas, tantos momentos, tantos suspiros, tantos goles e tantas lágrimas que agora nem parecem existir... São vagas fotografias em minha mente tão perdida nesse mundo em que vivo. Não, eu não sinto saudades. Já senti. Agora não sinto mais. Agora é tanto faz, pois fora tão distante de mim que eu nunca soube como escrever ou como lhe dizer que no ápice de nossos reencontros e desencontros, a gente nem se olhava mais. A gente nem sabia de mais nada. A gente se perdeu na vida. A gente tá fumando cigarros diferentes agora e você não reclama mais do meu. Você até gosta dele agora.
 Não sei por onde você anda, com quem está, por onde vai e por qual atalho fugirá, porque chegamos bem perto de nos encontrar novamente. Na verdade, te vi de longe. Você não me viu. Engoli em seco e permaneci seguindo como deveria ser, quem sabe eu até escreva uma poesia ou outra coisa para este momento, quem sabe eu até tenha pensado em lhe chamar. Quem sabe, quem sabe, quem sabe.
 Faz tanto tempo que ando descalça que nem sei mais como é tirar um cochilo no sofá da sala.

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