Archive for março 2012

Noite de frio.

 A noite estava bem fria, o céu estava coberto por nuvens que não deixavam-nos enxergar as estrelas que ali se escondiam, junto com a lua, como se fossemos crianças brincando de esconde-esconde. Procuravamos alguma direção mas elas simplesmente fugiam ou se escondiam cada vez melhor de nós. Dei um sorriso, pois não faria muita diferença se encontrar naquele instante, a luminosidade daquela fogueira um pouco mal feita me aquecia, juntamente com os pensamentos distantes que insistiam em se aventurar em minha mente, mesmo com uma noite tão gelada.
 Estava na agradavel companhia da menina dos cabelos alaranjados como um por-do-sol, daqueles que se misturam com a poeira vermelha dos solos pisoteados e marcados por histórias que ninguém se atreveu a discutir, combinavam perfeitamente com um par de olhos verdes, que me lembravam o mar e podiam fazer o contraste perfeito de um lindo por-do-sol sumindo num horizonte infinito daquele oceano tão imenso e aquela minha vontade enorme de me jogar dentro dele e mergulhar fundo, como se não tivesse volta, como se eu pudesse respirar, como se tudo pudesse mudar.
 Ela sorria, timida, segurando a garrafa de vinho em sua mão, como se fizesse alguma diferença embriagar-nos somente para nos aquecer ou nos divertir, falando besteiras, mesmo cansadas e com longas olheiras que demonstravam o quanto haviamos caminhado para chegar até alí.
 O silêncio logo fora quebrado com o barulho da rolha do vinho se desprendendo da garrafa, deixando todo seu conteúdo vulneravel, tornando-o mais atraente para que logo bebessemos de uma vez e esquecessemos tudo o que já havia passado. O fogo continuava alí, o frio era pertinente mas deixava pequenas lembranças de algumas vozes em meus cabelos, que agora estavam bagunçados, pois acompanhavam lentamente a dança que essa brisa insistia em fazer junto com algumas folhas que alí tinham.
 Não demorou muito para que bebessemos todo aquele vinho. Não precisava ser algo mais caro, mas era argentino e era delicioso. Talvez estivessemos um pouco mais quentes agora e a únia coisa que faziamos alí era sorrir, uma para a outra, como quem não quer nada, como quem tem tudo e não precisa de um refúgio, daí se me aproximo dela é porque quero ver de perto tamanha pureza e beleza que alí havia. Ela sorria e eu segurava suas mãos.
 - Está com frio?
 - Nem tanto... Você?
 - Só se você estiver.
 - Mas se também estiver...
 - Não, não, não precisa continuar.
 Tomei-a em meus braços e me calei. Procurei alguma coisa mas nada conseguiria encontrar enquanto aqueles cabelos "por-do-sol" se espalhavam pelos meus braços, lentamente e logo percebi que havia demorado demais. Acho que nunca havia notado como era especial. Uns cabelos laranjas, um par de olhos verdes, uma noite fria e um bom vinho argentino.
 Para onde vou agora?

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Para ela...

 Que eu nem conheço direito. Algumas conversas bobas, atração fisica, intelectual e mais todas aquelas besteira que fazem com que uma alma que há muito tempo, anda acompanhada pela miséria, se torne vulneravel a pequenas coisas que passam a fazer significado. Uma alma que há muito tempo não encontra o seu lugar, ou talvez nunca tenha encontrado pois nunca quisera fazer parte de nada, uma alma que teme tanto e por isso perde. Na verdade, uma alma que nunca teve nada a não ser um caminho doentio, rumo a qualquer lugar que a mantesse afastada de amores e desamores, que tornaram-na algo vazio, sem muito o que falar.
 Escrevo lá minhas palavras bem dotadas, que me falta o dominio sobre elas, mas tento descrever o que anda acontecendo. Quero saber, quero entrar e quero participar, mas poucas são as oportunidades que tenho para tentar ao menos dialogar contigo, pois se não for pelo simples medo de errar e dizer algo de ruim é simplesmente porque não existem palavras perfeitas para lhe dizer o quanto eu queria conhecer o seu mundo tão diferente do meu.Um mundo que parece ter cor, ter vida, ter tudo, tem amor alí e mesmo com desamores, não a destróem. Um mundo totalmente diferente, que compartilha das mesmas coisas que o meu, mas tudo do bom e do melhor, enquanto eu fico com meu branco e preto, sem pressa e sem vontade de colori-lo como se fosse uma pintura digna de ser respeitada. Meu mundo não tem respeito, meu mundo não tem nada. Meu mundo não tem vida.
 Embora eu "viva" essa "vidinha" que eu penso ter, simplesmente cansei de estar sozinha e quero arriscar. Quero sorrir e quero transformar estas palavras que há muito tempo nada sentem em algo único, para lhe descrever tantas coisas únicas que poderiam oferecer. Como se fosse um último romance, repleto de lembranças e afetos, algo seguro, aonde você segurasse a minha mão e me dissesse pr'eu não me preocupar, ter fé e ver coragem no amor, daí só de te ver, eu pensaria em trocar a minha tv num jeito de te levar a qualquer lugar que você queira e a nossa poesia ficaria completa.
 Eu não tenho muito o que dizer, não sei como chegar e tenho medo de errar, pois não quero lhe perder e nem quero me perder. Não novamente. Mas se eu fizer o possível, você me deixaria entrar? Iria esbarrar comigo pelos corredores e sorriria para mim, tornando o meu mundinho um pouco mais feliz? Não iria ter medo de estar com alguém como eu? Tudo isso se eu simplesmente conseguir e for capaz de te ter para mim? Queria tanto, quer dizer, quero, mas não posso... Não muito, não o suficiente. Mas vou tentar, porque és diferente e porque quero lhe fazer feliz.

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Aos sonhos passados...

 Uma curta e grosseira resposta a um pequeno deslize que tive no dia vinte e três de Outubro de dois mil e onze. Um sonho que talvez tenha marcado o meu dia, minha semana, mas que depois de um tempo, fora esquecido como qualquer outra coisa que talvez não significasse muito. Fora marcante... Por algumas horas, apenas. Por algumas perguntas e questionamentos.
 De certo modo, diria eu que acreditar em sonhos é algo um tanto quanto estúpido, pois não faz sentido algum. São desejos do subconsciente, vontades reprimidas e outras coisas que talvez interrompam o ciclo de se satisfazer tanto fisicamente quanto intelectualmente, embora 'saibam' que nem tudo está ao seu alcance.
 Dito e feito. Encontrei-a. Seu nome não começa com "A" mas ela tem os mesmos olhos marcantes. Os mesmos cabelos, o mesmo sorriso, a mesma ternura, doçura e a mesma altura que tinha no dia em que, por acaso, a encontrei em meus sonhos perdidos. Não sei se devo acreditar nisso agora ou depois, ou se devo simplesmente deixar pra lá e fingir que nada aconteceu, que é apenas algo da minha cabeça e que estou ficando louca, mas talvez eu tenha certeza de que encontrei essa garota.
 Não sei muito sobre ela ainda, não sei o que ela estava fazendo nos meus sonhos naquela noite, mas sei que ela está aqui. Seria essa a verdade? Provavelmente vou cair na mesma situação de todas as vezes. Rodeios irracionais, um tanto emocionais, estúpidos e clichês, do tipo que não me atraem, do tipo que me trazem palavras e mais palavras guardadas em uma mente que ainda consegue manter o seu nivel de lúcidez. Não sei se quero perder a cabeça, mas acho que quero pedi-la para me deixar entrar.
 Por uma noite ou duas, tanto faz, se eu a encontrei é para não ter medo dessa vez.

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Retornando a Minas Gerais.

 Estou com saudades. Sim, sim, saudades das viagens de carro que eu costumava fazer quando era menor, indo para Minas Gerais, estado natal de minha mãe, que agora vive apenas na memória da pequena e pacata cidade de Três Pontas, no sul de Minas, rodeada por morros e histórias de um passado que quase ninguém se atreveu a descobrir... Ou talvez se questionar.
 Gostava de andar por aquelas estradas longas, infinitas, observando os morros que predominavam naquela região. Uns com algumas arvores no topo e outros sem nada, outros apenas com uma só e davam aquela sensação de paz, até bucólica de se imaginar o que alí se passava. Longos terrenos com morros cada vez mais altos ou mais baixos, verdes como um pasto europeu e os cabelos longos, louros escuros, voando pelo vento com os óculos escuros, de quem escondia não só as tristezas, mas como tudo o que acontecia nos dias anteriores e eram completamente apagados toda vez que subiam os morros de Minas.
 Ah, não, não, não sou mineira. Mas tenho origem da política do café com leite e me sinto bem toda vez que viajo para Três Pontas e desfruto daquela enorme plantação de café também. Já sou apaixonada por café e gostaria de dar umas longas voltinhas por aqueles campos extensos que parecem ser tão espaçosos e vão subindo e descendo, até se perderem no horizonte sem fim, acompanhando aquele relevo tão (in)delicado daquela região tão fria nas noites de inverno.
 Daí, lembro-me de passar em frente a um antigo casarão. Minha mãe contou-me histórias sobre esse casarão. Era uma fazenda antiga, talvez fundada na época de 1800 e alguma coisa, não consigo me recordar do nome mas era algo que terminava com 'Negra' e parecia um casarão portugues, agora pintado de azul, com longas janelas de madeira, as portas também longas e uma recordação quase assustadora de ter algum tipo de relação com a história do ouro... Talvez alguma familia muito bem sucedida, mas era um icone quase inapagavel da pequena cidade que por alí por perto ficava.
 Assim que cheguei na cidade e fomos em direção a casa do meu tio avô, percebi como era a vidinha dos três pontanos que ali viviam, em paz, como se não houvesse muitas preocupações. Alguns andavam de bicicleta e outros passeavam pela pracinha da igreja, com seus filhos. Subimos um longo morro, meu pai resmungava baixinho pelas falhas que o carro apresentava ao subir aquele lugar e quando chegamos lá no topo, eramos capazes de enxergar a famosa serra de Três Pontas ao longe e do outro lado, um vasto terreno cheio de matos e com algumas torres ao longo. Dei um pequeno suspiro e sorri ao observar a cidade.
 Bem que queria voltar. Três Pontas, ah, Três pontas.

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Sobre eu, sobre ela e sobre tudo a nossa volta. Mais ou menos.

 É que hoje eu quero falar do cotidiano e de como as coisas eram um pouco antes disso acontecer. É. Desse domingo. Eu poderia muito bem estar sentada com os pés pra cima, vivendo vida folgada, me entupindo de alcool, fumando um bom cigarro e talvez ouvindo alguma coisa não tão requintada. Algo mais pra um rock antigo, talvez Ramones ou Led Zeppelin... Tanto faz, mas eu poderia bem estar fazendo isso. Em paz.
 É que resolvi ter a brilhante idéia de aceitar o convite da Beatriz para uma tarde excepcional de domingo, aonde fumariamos um bocado, falariamos merda, tocariamos violão e eu poderia começar a semana 'bem'. Entretanto, as coisas saíram do meu controle quando Ela anunciou que ia. Ela, cuja não vou citar o nome, afinal, não é de interesse de ninguém e nem do meu próprio interesse. Ela anunciou que iria e as coisas ficaram 'estranhas' depois de um certo tempo. É, eu não sei o que aconteceu mas se eu soubesse, eu evitaria tudo e voltaria, porque não quero, porque não posso. Porque não sou o tipo de pessoa que 'espera', porque sou Machadiana e não gosto de ter nada, pois detesto perder o que me importa.
 Merda. Grande merda. Poderia ser tudo mas no final, não é nada. E depois eu volto para casa, com o vento no rosto e aquela paisagem urbana passando por meus olhos, perdidos, tristes e melancólicos, demonstravam o quanto tudo isso poderia se transformar em um grande pesadelo. Segredo? Intimo. Ninguém precisa saber, ninguém pode saber.
 Mas se ela quiser... Ah se ela quisesse... Droga, estou falando de novo.

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Livro velho.

 Eu não dava nada a primeira vista. Nada mesmo. Nem o braço a torcer. Até porque aquela garota de cabelos claros, um louro puxado para o castanho, de olhos pequenos e sutis, tão singelos quanto o seu sorriso, de garota inocente, de garota que queria aprender a viver, de garota ingenua, não me chamou muito a atenção. De jeito maneira. Nem o jeito com que ela me olhava.

 No compasso dos longos dias que eu costumava a frequentar, ela fora começando a participar. Já era rotina dar aquele sorrisinho de canto ou apenas acenar quando nos esbarravamos por aí, porque eu ainda não dava nada por ela. Ainda não dava nada por mim, porque gostava de ficar sozinha.

 Ela, com a meiguice, fora tornando as tardes da minha imensa solidão em algo estranho, algo único. Estava sempre com um sorriso contagiante e gostava de proferir palavras doces e sinceras, como uma criança que cuida do seu primeiro peixinho ou como um solitário qualquer cuida de seu cigarro, se sufocando na fumaça, procurando refúgio e ela me pedia para se aventurar. Não sei muito bem pra onde, mas eu sei que ela queria.

 Daí, as coisas passaram a mudar. Eu já conseguia dar algo em troca. Mas era como um livro velho, surrado, que ao se abrir sem o minimo cuidado sequer, rasga e acaba por se tornar cada vez mais inútil, cada vez pior. Tornando seu conteúdo algo ilegivel, indecifravel, sem esperanças de um dia poder voltar. Hei de não me abrir para nada perder, para nada acontecer, porque nada funcionava assim. Eu era aquilo. Pedra. Pedra sem essencia e ainda sou. Embora ela saiba tão bem me folhear que me sinto a vontade e deito pra descansar no colo dela, já que a noite, muitas vezes, parece ser cruel com as pequenas palavras escritas dentro de mim.

 Então ela me fechava com cuidado e marcava a pagina. Sempre quis ler. Sempre quis entender. Tentava traduzir cada simbolo que alí existia, mesmo que não conseguisse, estava tentando. Era demais e me causava uma sensação enorme de segurança. Um livro velho sem a luz do sol.

 Enquanto me sentava na mesa para tomar um café, com olhos fechados, ela me dava bom dia. Boa tarde. Boa noite. Um bom suspiro. Aí eu descobri que não tinha porque temer. Era especial e ela cuidava de mim. Como ninguém. Como um alguém.

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Lógica emocional.

 Me deixei levar? Não, acho que não. Eu julgo tudo pela minha frieza e insensibilidade. Aquele aperto rotineiro dentro do meu sistema inútilmente emocional. Umas duas bobagens ou três e que me levam a lugar nenhum e daí fico a pensar, a rasurar papéis, trocando a minha lógica de lugar, talvez tentando me deixar levar por um momento ou por uma situação, o que raramente acontece, porque eu gosto de me contrariar, na verdade, eu nunca nem sei como acabo por me 'perder' já que eu nunca consigo me encontrar.
 É tudo tão estranho que na maioria das vezes, sinto como se estivesse andando entre milhares de pessoas, todas conhecidas ou todas desconhecidas e acabo por me sentir só, daí descubro que existe algo a mais aqui e que eu prefiro me sentar em um muro bem alto, aonde a queda possa doer mais, simplesmente por não decidir em qual lado eu deveria ficar, qual caminho eu deveria seguir, quais pessoas eu deveria enxergar melhor. Mesmo com tudo a minha volta, eu acabo caindo e não me canso disso.
 Óbviamente, me sinto como uma folha amassada. Daquelas que por mais que se esforce, nunca volta ao normal. As vezes até posso rasgar e não haja fita adesiva que me cole novamente, porque não quero, não consigo e dificilmente suplico por tais situações. Estou imunda, rasgada e amassada. Estou jogada por aí, sem utilidade alguma. Ninguém quer ver, ninguém quer escrever, ninguém quer tentar, pois sou feita de rasuras também. De cicatrizes. Fundas.
 É que eu gosto de nunca fazer sentido, mas me arrependo toda vez que acredito que sei demais, pois é mentira. Não sei de nada e as vezes prefiro continuar na minha tremenda ignorancia em relação a certos paragrafos desse livro. Não sei o que sou e nem da onde eu vim, mas também nunca sei o que quero. Embora os dias passem e a vida continue, eu estou aqui, sentada na fronteira da vida, balançando as pernas e procurando um horizonte ao qual eu realmente pertença... Ou talvez nunca pertença. Ou apenas queira pertencer.
 Estou perdida. De novo.

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Marinheiros.

 É que a gente se deu bem e foi de cara. É que eu dei um sorriso e ela deu outro, que veio um abraço e depois algumas palavras e começamos um dialogo. Inesperado, inexplicavel, mas é aquele sorriso pisciano especial que ela tem toda vez que conversamos besteiras, toda vez que sentamos numa mesa de bar para beber uma boa cerveja gelada e rimos de bobagens, contamos casos perdidos, histórias de marinheiros. Os portos que deixamos, as mulheres que se foram e os corações que batiam estridentes.
 Depois de umas decepções ou outras, acompanhadas por um cigarro com sabor de cravo, o favorito dela, falavamos de como gostariamos de voltar a remar em alto mar. É que lá as coisas eram mais faceis e o momento de deixar os portos, nunca parecia triste. A gente se curava com a maré e as lágrimas que pelo mar vagavam, se perdiam a 3 quilômetros da costa, mar aberto, mar azul, mar infinito. De luzes e de constelações, nós viviamos e sabiamos que cedo ou tarde, chegariamos a outro lugar. Era uma tal ansiedade misturada com um desejo imenso de saber o que havia pela frente. Aquele instinto de aventura, inspirando tais possibilidades de se encontrar um novo dia, com novas histórias a serem contadas.
 As roupas brancas, com o passar do tempo, iam se tornando tão surradas e tão empoeiradas quanto nossos sorrisos, que passavam a perder a esperança depois de longos meses sem um novo amor em um novo porto, talvez no mar do Caribe ou coisa parecida, vivendo de sol e de nuvens, de estrelas e talvez até da lua. Mas eu gostava de me sentar na proa daquele návio e tocar minha gaita, enquanto ela dedilhava alguma coisa no violão e sussurravamos frases feitas sobre a saudade que sentiamos de muitas outras coisas.
 Já perdemos tanto que agora isso nem importa mais. Sabemos o que temos, sabemos o que queremos e talvez saibamos para onde vamos. Podemos até resmungar as nossas vontades e desilusões, nossos medos e paixões, nossas promessas rompidas de voltar pra casa logo cedo, como esperavamos. Nos sujeitamos a isso, essa vida de marinheiro, de mar azul, de porto a porto, com um cigarro na boca e um copo com a cachaça mais chula do boteco mais próximo. Embriagadas. Porque não tinhamos nada a perder e se tivéssemos, não seriamos marinheiras e nem gostariamos de navegar.

Dedicado a Beatriz Fagundes.

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Anônimo.

 É que eu resolvi escrever pra ela hoje. Não sei porque, mas eu quis escrever pra ela. Sim, pra ela. Pra ela que eu nem sei quem é, nem sei como ela se parece, mas sei que ela está por aí, em algum lugar, talvez pensando no mesmo que eu. Talvez ela esteja sentada num banquinho agora, tomando um sorvete ou talvez esteja andando entre milhares de pessoas a fim de resolver algum de seus compromissos ou talvez esteja sentada na sala de aula, com a mão erguida, esperando a sua vez para tirar aquela dúvida que tanto a aflingia, talvez ela esteja por aí... Talvez ela nem exista.
 Talvez seja apenas um fruto da minha imaginação, uma fotografia velha em um tom amarelado, colada em algum canto da sala aonde a iluminação externa não possa atingir. Nem a interna. E com um cigarro na boca eu continuo observando aquela imagem abstrata, um retrato de 'nada', um retrato inexistente entre minhas poucas e longas tragadas. Longos suspiros.
 Queria saber. Queria muito. Embora não soubesse o suficiente, embora eu nem saiba o nome dela ou de onde ela veio, aonde ela mora, em que lugar ela gostaria de viver, se gosta de tirar um cochilo sobre as nuvens de algodão, durante a madrugada. Nem sei se ela tem olhos castanhos. Nem sei se ela fuma ou se ela gosta de política e lê livros de romance. Nem sei se ela sabe sorrir e nem sei se ela vai me querer de volta.
 Talvez ela esteja escrevendo pra mim também o que eu gostaria de ouvir, ou não. Talvez estivesse dirigindo o seu carro, dentre os milhares que acompanham o dia lá fora e pensando se um dia vai encontrar alguém que a queira. Porque quando se é acostumada a viver como eu, tudo se torna mais facil e superficial. Não sei muito de tudo e sei tudo de nada.
 É remando sozinha que eu aprendi que as coisas são mais faceis quando não há nada a se perder, embora seja melhor ter algo para abraçar, quando quiser se afogar.

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Pequeno oeste.

 Eu cresci numa cidadezinha empoeirada que ficava a beira de uma estrada coberta por areia. Ninguém sabe aonde fica, ninguém sabe o nome, mas foi dali que eu vim. Foi seguindo essa estrada empoeirada rumo a um lugar qualquer que eu cheguei aonde estou, embora não saiba muita coisa, com apenas 30 paus no bolso achando que poderia fazer algo de diferente.
 Com uma calça marrom, larga, presa apenas pelo meu suspensório também marrom, sapatos desbotados, uma blusa branca, com o terno velho e surrado equilibrado por dois de meus dedos, que se apoiavam em meu ombro, enquanto meus olhos continuavam fixos naquela estrada que parecia ser infinita. O suor escorria e pingava, deixando vestigios pela areia que ali estava também, a procura de alguma coisa, que saía voando quando o vento batia e a levava para o outro lado, aonde nenhum carro ou nenhum ser humano se atreveria a passar. Eu estava ali porque eu não tinha pra onde ir. Eu era apenas um garoto de uma cidadezinha desconhecida no oeste daquele país, cujo não tinha nada a não ser a esperança de sobreviver até 1945, já que em 30, era tudo um pouco mais complicado.
 Foram dias e mais dias na estrada, até encontrar um boteco. Entrei no mesmo e daquele dinheiro que eu tinha, investi em algumas doses de whisky barato para aliviar o cansaço que andava sentido por caminhar por tantos dias. Eram muitos papos de lá, muitos papos de cá e alguns deles até comentavam da cidade próxima. Perguntei a eles se teria chance alguma de conseguir algo alí. Os dois se entreolharam e passaram a debochar da minha cara, dizendo que um garoto como eu nunca conseguiria nada alí, óbviamente, eu não sabia nem escrever direito.
 Não desisti. Prossegui com a viagem até enxergar de longe, as várias luzes que iluminavam e acolhiam aquele lugar tão mágico perto de onde eu vivia, aonde as casinhas eram feitas de madeira. Não. Alí havia tijolos, alí haviam automóveis que eu nunca havia visto antes, alí tinha de tudo, alí tinha um sonho, alí tinha a esperança. Então, com um sorriso estampado na face, andei alegremente o que ainda restava da estrada, preparado para mudar de vida.
 E o que aconteceu comigo? Gastei tudo o que me restava em vários copos da cachaça mais chula que alí poderia existir. É porque conheci, é porque me envolvi. É porque eu não sei de nada. Porque nunca vou saber.

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Rascunhos.

É que eu não quero, eu não posso muito não, mas eu quero tudo e não quero nada, porque me contraria a vontade de estar vulneravel
e não me agrada o fato de me sentir fraca por bobagens que nem parecem ser tão importantes, embora sejam, embora eu não as queira.
É que fica bem perceptivel das vezes em que... A gente tropeçou por aí, naquela linha que costumavamos seguir e tudo pareceu se embolar, se tornar algo transparente e quase intocavel. A menos que tudo passe a se queimar e os dois, finalmente, possam se separar, mesmo com tantas cicatrizes deixadas para trás, nada mudará o que um dia já esteve 'presa' aquela linha.
Não, eu não sei quem é você, não sei nem o que cê tem, mas eu sei que eu quero. Acho que preciso também bem mais do que imagino.
Não sei se estou fraca, não sei o que há de errado, mas acho, só acho, apenas acho, que quero segurar a sua mão.
É bem aquela coisa de querer e não saber, daí depois vemos os 'poréns', o porque de não ser e o talvez de querer, podemos nos preocupar com isso? É como remar em um barquinho e ir para a direção errada sem saber como voltar, embora acabe se tornando certa.
Perdoe-me, mas estamos ficando loucos? Por me...?
...
Falei demais.

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Engrenagem.

 O mundo dele era movido a engrenagens. Tudo era muito mais do que artificial e o coração que batia em seu peito era uma máquina. Naquela época, naquele lugar, os seres humanos viviam de forma diferente. Ninguém mais era feito de pele, de carne, de sentimentos. Todos eram feitos de engrenagens, sejam elas usadas, enferrujadas e quebradas, eram a ferramente mais poderosa que tinham para curar todos os seus problemas, afinal, quem precisava de fragilidade? Quem precisava ser sentimental? Quem precisava ser eu?
 Foi o dia então, que ele encontrou no chão, bem distante de sua cidade de engrenagens, uma pequena rosa. Vermelha, perdida, no meio do nada, desprendida de tudo. Alguém deixara por alí, sem nem ao menos se preocupar com a sua delicadeza. Sua cabeça sacudiu lentamente, de modo confuso, como pequenas ferramentas, surgindo dalí um pequeno ruído, quase imperceptivel a seus ouvidos.
 Seus olhos eram azuis artificiais e não tinham cor de nada, mas por alguns segundos, quando captou a cena daquela inofensiva rosa atirada ao chão, como quem pede socorro no mais delicado gesto de compaixão, tomou-a em suas mãos, embora soubesse que 'maquinas' como ele, não podiam tocar objetos tão puros, como ela, como a pequena rosa que possuía um aroma tão doce quanto as flores de graxa que, pela sua cidade, estavam espalhadas.
 Sorriu, mas não foi por muito tempo.
 É que quando ele a tocou, ela morreu. Simplesmente morreu. De vermelho vivo, cor de sangue, cor da vida, foi escurecendo até se tornar totalmente preta, totalmente sem vida, sem nada, sem vontade de exalar mais uma vez aquele aroma tão delicioso que nunca havia sentido antes.
 ...
 Nenhuma lágrima derrubou, porque pessoas como ele, não choravam. Maquinas não eram feitas para chorar. Maquinas não sentiam, maquinas eram poetas, maquinas fingiam sorrir.
 Ele a apertou com as forças que ainda lhe restavam e quando se deu conta, o seus ruídos passaram a aumentar e seus movimentos, a regredir, pois numa hora em que sabia tudo sobre a rosa, não sabia mais nada. Seus olhos que eram azuis, agora perdiam as poucas cores que ainda lhe restavam e tornavam-se cinzas. O óleo que lubrificava suas pernas agora escorria, de forma lenta, tomando conta de cada pequena parte daquela sua expressão de que nunca havia sentido nada.
 Quando fora perceber, que era pra ser o seu último romance, com uma pequena flor, soube o que era viver, mesmo que não soubesse antes. Acho que andava morto, porque não obedecia suas próprias vontades, aquelas mesmas que lhe faltavam. Agora que as pétalas, entre seus dedos, se misturavam com o óleo que insistia em demonstrar fraqueza, se misturou com algo mais. Parecia agua e parecia vir de algum lugar. Parecia ser salgada. Sim, sim, era um tanto salgada, era um tanto diferente das outras aguas que aquela rosa já havia experimentado. Parecia sincero, parecia sentimental, parecia humano, parecia eu.
 E em um triste suspiro, num belo brando de um campo minado coberto com pequenas peças que agora pareciam se demonstar, lá estava ele, de mera maquina a um simples poeta com uma rosa negra nas mãos.

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Canetas, letras, arvores e folhas.

 Enquanto as nuvens correm depressa pelo infinito azul, procurando se aventurar, eu estou aqui. Sentada num banquinho de uma praça exatamente as três horas da tarde de um domingo. O calor está intenso mas a sombra da arvore alivia um pouco. A caneta em minha mão, pecorre o papel como quem se aproveita do último pedaço do seu doce predileto, ou do último gole de café, degustando até o sabor subentendido do que alí estava sendo dito, ou escrito, ou ingerido. Não havia ninguém na rua e ouvia-se apenas o barulho das folhas das arvores dançando com o ritmo do vento que chegava como um invasor e levava consigo as fracas, roubando-as, escravizando-as e depois, atirando-as em qualquer lugar, talvez no local mais próximo, já que se esgotara com o tanto que havia carregado, até que derrepente, com todo aquele silêncio, ouvi algumas vozes que vieram pelo vento.
 - Todo mundo quer a metade da sua laranja. Não me diga que você não quer!
 - Eu não procuro, eu não preciso e eu não acredito nessas coisas.
 - Fala sério! Tem gente que nasce uma pra outra.
 - Pré destinadas?
 - Lógico!
 - Não acredito.
 - Larga de bobagem!
 Me calei mas fixei meus olhos na direção das vozes e depois, voltei-os para o papel com algumas palavras entrelaçadas, com a caneta repousada sobre o final de uma delas.
 Metade da laranja? Isso é uma coisa meio clichê. Não acredito nisso também. Não sou o tipo de pessoa que procura a metade de uma laranja porque afinal de contas, as laranjas são todas doces. Ninguém quer uma metade de uma laranja azeda, todos a querem doce assim como chocolate. Querem algo que lhes dê prazer, querem algo que seja exatamente igual, querem algo que os faça se encontrar mas... De onde vem tudo isso? Não faz o menor sentido.
 Eu não sou doce. Gosto de café doce mas na maioria das vezes, o tomo amargo, porque me agrada. Sou azeda. Sou como um limão. Diferente das pessoas, eu não quero uma metade doce, eu quero uma metade tão azeda quanto eu. Exatamente isso. Azeda. Quero uma metade acida e azeda. Não preciso de palavras de conforto o tempo inteiro, não preciso de doçura, não preciso de muitos agrados. Eu gosto do jeito que as coisas são: amargas e azedas, assim como a realidade, porque no final das contas, quando acabar, vamos continuar sendo azedas e acidas e as coisas ao nosso redor sempre serão as mesmas. Eu não ligo muito pro convencional, mas gosto mesmo das coisas quando elas não fazem o menor sentido.
 Por isso e por outras coisas, eu digo que sei o que quero. Não quero a metade da minha laranja mas sim, a metade do meu limão. Talvez um açucar para o café, um afago nas noites de chuva, um brinde nas noites de calor, um beijo na hora da dor e... Quem sabe... Um amor para me recompor.

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Em alto mar.


A cidade estava escura. Iluminava-se apenas com os faróis dos carros que corriam em direção ao seu próprio destino e com os postes abandonados que ali permaneciam, sem pestanejar e sem bocejar. Eu dirigia pelas avenidas largas daquela cidade, rumo a alguma coisa que me fizesse crer no simples fato de que tudo dera errado de que era culpa minha, mesmo que não fosse. Eram exatamente cinco horas da manhã e o sol não havia dado nem o seu primeiro sinal.
 Há algumas horas antes, eu estava com você. Sim, eu estava com você. Não entendi muito bem o que foi que realmente aconteceu, porque no fim você acabou por me evitar, mas você me olhava sem emoção alguma, seus olhos estavam tão escuros que eram apenas iluminados pelas pequenas luminárias em volta da piscina. Sua expressão era mutua e seus lábios, não se moviam. Meus olhos, que viam os seus, se mascaravam por mais que tentassem brilhar demais e tudo parecia não fazer sentido naquele instante.
- Então foi assim?
- É, é, bem assim.
- Mas não tem exatamente com o que se preocupar... Não há nada relacionado a você.
- É, mas de qualquer forma, está ao meu redor.
 Fui longe demais. Fim. Era tudo o que vinha em minha cabeça naquele instante. Fui longe demais! Eu não pude e nem consegui controlar o que havia acontecido, mas alguma coisa mudou no instante em que você me arrastou para o seu mundinho tão novo. Tão diferente mas ao mesmo tempo tão idêntico a todos os outros que eu já havia conhecido. Teus olhos não diziam nada, eu não dizia nada e minhas mãos se afobavam ao pelo menos tocar em você. A noite escura contava-me histórias sobre pessoas perdidas mas há muito tempo já me contavam histórias daqueles que acabavam indo longe demais e eu continuo me fazendo a mesma pergunta todos os dias: O que houve? Não sei. Não sei bem lá o que houve, o que você fez, pra onde eu remei, pra onde me levei... Mas sei que aconteceu. Sei que mudou. Sei que te quero mas continuo dirigindo sem rumo por aqui, tentando me lembrar aonde eu poderia chegar. Dei um longo suspiro como quem não quer mais nada e procurei o rumo de casa. Talvez eu soubesse agora, melhor do que nunca, que chegou a hora de parar. Mais uma vez.

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Café amargo e o sol de Ipanema.

Gostava de café. Amargo. De preferencia amargo.
Todo dia de manhã tomava o seu café no mesmo lugar de sempre, em algum canto de Ipanema.
E olhava o mar. E não sorria.
Enxergava o sol da manhã, como laranja. As vezes enxergava como um azul, bem intenso.
Que escurecia então, o céu do Rio de Janeiro.
Mas ele preferia o azul escuro intenso, afinal, o brilho que continha em seu olhar quando observava era maior do que o reflexo do sol no mar.
E contemplava. E admirava. E perdia seu tempo.
Acompanhado sempre de sua solidão, que era sua melhor aliada.
E não se entristecia. Não sabia sorrir.
Franzia a testa, com um ar de sabe-tudo e não sabia nada.
Mas tomava seu café, sozinho, em Ipanema, as quatro da manhã.
(28/04/2011)

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Atos, frascos e estilhaços.

 The whole world told me I should disappear... Where should I go?
 Não sei. Não faço a minima idéia. Enquanto os dias correm lá fora, meus olhos continuam pregados no escuro do meu quarto, mesmo com a janela aberta, mesmo com o sol no lugar da lua, mesmo com a lua no lugar do sol e continuo pestanejando devagar, sem chegar a algum lugar, sem pressa e sem mais demora.
 Como, de fato, eu deveria esperar, meus olhos encontravam-se um pouco secos, avermelhados também mas ninguém sabia a causa. Nem os médicos. Nem ninguém. Então resolvi embarcar na minha tripulação de barquinhos de madeira rumo a algum lugar que não fosse previsivel, com uma brisa mais leve que a dor do mar e que me trouxesse algum brilho nos dois lados de cá.
 O cigarro queimava no cinzeiro ao lado, as cinzas faziam seu movimento, mergulhando na louça daquele objeto tão gelado, enquanto a fumaça fazia sua coreografia, rumo a qualquer lugar que pudesse ir, sendo levada e logo se desfazendo, como um belo espetaculo de ballet classico, ninguém saberia dizer o porque, ninguém saberia dizer para onde, mas elas continuavam indo.
 Meus lábios, entreabertos, se movimentavam lentamente e tremiam um pouco. Ressecados com pequenos cortes e cicatrizes. Acidos como limões bem azedos, pronto para fazer arder qualquer ferida que os tocasse, embora estivessem um pouco cansados. Por isso tremiam e de minha boca não saía nada, a não ser palavras impossiveis de serem entendidas. Eu gaguejava algumas vogais mas nada. Nada mais.
 Então volto a me lembrar de quando me disseram que eu precisava desaparecer, mas eu não saberia para onde ir. Foi quando descobri que de todos os amores, nenhum deles eu realmente amei. Que de todos os desamores, de todos eles, eu sofri. Que de todas as mãos que eu peguei, a maioria, eu me esqueci. Que de todos os abraços que sonhei, poucos, eu recebi. Que de todas as lembranças que eu tenho, nenhuma é feliz. E que de todos os contos que eu já escrevi, nenhum foi recíproco e é verdade. A melancolia me envolveu em seus braços e me acolheu. Agora com um copo de whisky, continuo a genial jornada para lugar nenhum.
 Se o mundo todo te pedisse para desaparecer, para onde você iria?
 E me faço essa mesma pergunta, todos os dias, sem saber que nunca vou encontrar a resposta certa.

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