Marinheiros.

 É que a gente se deu bem e foi de cara. É que eu dei um sorriso e ela deu outro, que veio um abraço e depois algumas palavras e começamos um dialogo. Inesperado, inexplicavel, mas é aquele sorriso pisciano especial que ela tem toda vez que conversamos besteiras, toda vez que sentamos numa mesa de bar para beber uma boa cerveja gelada e rimos de bobagens, contamos casos perdidos, histórias de marinheiros. Os portos que deixamos, as mulheres que se foram e os corações que batiam estridentes.
 Depois de umas decepções ou outras, acompanhadas por um cigarro com sabor de cravo, o favorito dela, falavamos de como gostariamos de voltar a remar em alto mar. É que lá as coisas eram mais faceis e o momento de deixar os portos, nunca parecia triste. A gente se curava com a maré e as lágrimas que pelo mar vagavam, se perdiam a 3 quilômetros da costa, mar aberto, mar azul, mar infinito. De luzes e de constelações, nós viviamos e sabiamos que cedo ou tarde, chegariamos a outro lugar. Era uma tal ansiedade misturada com um desejo imenso de saber o que havia pela frente. Aquele instinto de aventura, inspirando tais possibilidades de se encontrar um novo dia, com novas histórias a serem contadas.
 As roupas brancas, com o passar do tempo, iam se tornando tão surradas e tão empoeiradas quanto nossos sorrisos, que passavam a perder a esperança depois de longos meses sem um novo amor em um novo porto, talvez no mar do Caribe ou coisa parecida, vivendo de sol e de nuvens, de estrelas e talvez até da lua. Mas eu gostava de me sentar na proa daquele návio e tocar minha gaita, enquanto ela dedilhava alguma coisa no violão e sussurravamos frases feitas sobre a saudade que sentiamos de muitas outras coisas.
 Já perdemos tanto que agora isso nem importa mais. Sabemos o que temos, sabemos o que queremos e talvez saibamos para onde vamos. Podemos até resmungar as nossas vontades e desilusões, nossos medos e paixões, nossas promessas rompidas de voltar pra casa logo cedo, como esperavamos. Nos sujeitamos a isso, essa vida de marinheiro, de mar azul, de porto a porto, com um cigarro na boca e um copo com a cachaça mais chula do boteco mais próximo. Embriagadas. Porque não tinhamos nada a perder e se tivéssemos, não seriamos marinheiras e nem gostariamos de navegar.

Dedicado a Beatriz Fagundes.

Bookmark the permalink. RSS feed for this post.

3 Responses to Marinheiros.