Pierrot pós-moderno.

 Como um palhaço cansado, sentado no chão empoeirado com um marlboro red na boca e o suor escorrendo pelos poros maquiados do rosto até então coberto por sorrisos, expressões hilárias e um pouquinho de irônia.
 As luzes apagadas, papéis jogados ao chão, silêncio quase impenetravel e apenas uma brasa, pequena, iluminava o que parecia ser um pouco da esperança que restava àquele ser que não tinha mais nada. Nem os sapatos tão grandes assim, nem as calças coloridas e engraçadas, nem a capacidade de arrancar risadas com tanta facilidade. Já fizera isso antes. Tantas vezes sem nem saber aonde iria chegar.
  Agora, tinha as mãos cobertas por cicatrizes e queimaduras, protegidas por uma luva laranja, que lhe lembrava o por-do-sol, que lhe lembrava... Deixa pra lá. Lhe lembrava coisas demais. Lágrimas e suor e talvez um pouco de cachaça pra amenizar a dor que sentia. Ele sabia. Era como o Pierrot que implorava pelo amor da Colombina, que lhe tornava os traços de palhaço nos traços de um bebado equilibrista, que a todo instante, caía e se feria ao som aplausos daquela platéia tão calorosa e tão gigantesca, comemorando a sua miséria e melancolia, escondidas nas maquiagens fortes, nas sombras pretas e nas cicatrizes de lápis em cada um deles. Uma platéia de Pierrots e um deles, era eu. Circo de lágrimas, trapezistas e suas manobras sobre os sintomas, as palavras, as flores, a música macabra e todos os rastros de maquiagem deixados pelo chão que manchavam o seu sapato velho.
 Muitas vezes, ao fim de cada espetaculo do circo de Pierrots, via-se longos rastros de maquiagem que se perdiam em direções distintas, como quem levaria algo a alguem, como quem se livra dos piores medos possíveis, como um Pierrot que finalmente deixou de amar sua Colombina. Infelizmente, nenhum Pierrot deixa de ser Pierrot, as Colombinas sempre existirão e os Arlequins também, tomando os doces sorrisos das Colombinas.
 Do outro lado da rua, o circo dos Arlequins e a sua esquerda, o circo das Colombinas e do lado de cá, circo dos Pierrots, que sentam no chão pra fumar um cigarro enquanto os espetaculos a luzes coloridas continuam por uma noite inteira. Marlboro red e Pierrots. Milhares de Pierrots. Como eu. Um eterno Pierrot.

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