Cinco amigos, cinco almas.

 Pedi para cinco amigos me falarem as cinco palavras que lhe dessem na telha no momento da pergunta. Cada um me disse algo distinto, talvez um pouco próximo do esperado ou totalmente disperso do que eu imaginaria ouvir de cada um deles. Um citou do conhecimento ao dinheiro, enquanto o outro expressou o seu desprezo pelas responsabilidades as quais estava submetido naquele instante, desde um pequeno trabalho em casa, até a melancolia de um poema de Clarice Lispector, o que torna tudo um pouco mais interessante.

 Um dedo cortado, um apartamento quase que vazio. Um irmão mais velho e uma prima, o calor e o clima seco de Cuiabá enquanto ela colocava suas mãos debaixo daquela agua corrente, gelada. Lavava os pratos com certa cautela, embora sua mente estivesse longe de suas ações. Fazia no modo automatico. Pensava em seus pais, talvez em uma musica, em alguém, não dava pra dizer exatamente no que, mas pensava. Pensava em tudo o que tinha pra fazer, em tudo que havia dito, no dia anterior, no amanhã e nas provas do cursinho. Pensava em como seria sua vida daqui pra frente. De tantos altos e baixos, tantas palavras e ela se perdia com o barulho que fazia lá fora.
 Era assim que agia. Olhos azuis com o reflexo da agua nas mãos, cabelos presos e um cansaço quase que incontrolavel tomava conta de seu corpo. Suspirava lentamente enquanto que de longe, pensava na música Janta do Marcelo Camelo com a Mallu Magalhães. O mais engraçado é que ninguém sabe muito bem o que se passa com ela. Talvez gostasse de ouvir essa música em um jantar especial, talvez pensasse em toca-la algum dia, talvez pensasse em decifrar várias outras coisas, já que é coberta por um mistério e um orgulho fora do comum. Não muito aparente, porque não é do feitio dela atirar qualidades ou defeitos no ar pra quem quiser entender. Gostava de guardar, como se fosse uma pequena caixinha cheia de segredos. Diferentes. Algo só dela. Algo que ela só pensava quando sentia aquelas aguas correntes ou quando a agua gelada do chuveiro tocava seu rosto palido, coberto por sardas e molhava seu cilios alaranjados, como os seus cabelos. Talvez ela abrisse os olhos mais um pouco e pudesse sorrir depois e se lembrar que mesmo sendo tão quente, poderia ser melhor. Um frio aqui, dois copos alí, uma cerveja no freezer e uma história pra contar.
 Se atirou no sofá e adormeceu, como quem não esperava mais nada de ninguém.

 Já em outro canto da cidade, temos uma garota de cabelos negros cacheados, longos, que combinavam com o tom de sua pele e com seus oculos que eram um pouco vintage. Ela acabara de ler um texto qualquer e dentro de seu ser, que parecia tão calmo naquele instante, idéias vinham a mil por hora. Pensava em poetas, sentimentos, melancolia e como todos eles eram feitos para o sofrimento. Como os poetas amavam diferente e amavam com uma grande tendencia a decepção e a dor. Colocando suas palavras imendadas em folhas de papéis amareladas ou manchadas, brancas ou cheias de rabiscos de algo que já existiu por alí. Sombreados de outros sentimentos e palavras e ela colocava sua mente desenhada nesse mesmo rascunho.
 Como se fosse um livro, folheava sua mente em busca de respostas, de sentimentos que não pareciam ter razão alguma. Ia atrás do irracional querendo acreditar no racional e não encontrava motivos. Não encontrava nada. Nada além de uma grande definição vazia de um dicionario que tentava explicar o sentimento "amor". Dicionarios são calculistas. Dicionarios são estupidos. Dicionarios não entendem de nada. Dicionarios não são como ela. Menina movida a sentimentos quase que impossiveis de se entender. Menina diferente ou indiferente, menina que aos olhos de alguns, era muito mais do que incrivel. Menina que talvez pensasse em alguem agora. Menina que ia dormir depois do jantar. Menina de olhos castanhos como a noite seca que fazia lá fora. Menina sentimental.

 Enquanto isso, voltando da faculdade tarde da noite, tinhamos um garoto de cabelos cacheados e louros. Era alto, magro, uma expressão bem timida na face para quem não o conhecia e um coração maior do que se imagina. Ele andava com passos lentos, resmungando de alguma coisa que havia acontecido e ao mesmo tempo, pensando em como seria bom deixar de lado todo esse estresse rotineiro para poder esquecer de tudo que lhe acontecia no momento. Pensava em uma massagem, talvez em algum show que pudesse lhe fazer beber quantas doses de tequila ele pudesse, para ficar embriagado e aproveitar por alguns segundos, uma felicidade quase que instantanea, que lhe deixaria com uma dor de cabeça terrivel no dia seguinte, mas seria apenas consequencia de uma noite bem aproveitada.
 A rua escura, os fones de ouvido e uma música boa. Provavelmente ouvia Oasis. Era bem a cara dele e continuava caminhando enquanto cantarolava algumas parte de uma das músicas mais famosas da banda, que se chamava wonderwall. Chutava pedras e sonhos. Tentava encontrar algo que não sabia muito bem o que era. Chafarizes em uma tarde de sol, no meio de uma praça, agua gelada, fonte de pureza, fonte de paz, aonde pudesse deitar no colo de uma pessoa especial e pudesse relaxar. Como se não existisse hora pra acabar, como se o mundo fosse parar e seus desejos, ficariam alí. Seu mundo seria aquilo e nada mais.
 Infelizmente, quando abriu a porta de casa, sentiu o calor novamente e todos os seus sonhos, foram pra cama, dormir para esperar um dia melhor.

 Pra lá pro outro lado da cidade, estava mais uma garota perdida em pensamentos. Em conversas no facebook, risadas altas e coisas do tipo. Conversava com alguém, não me recordo quem no momento, mas conversava algo sobre a paixão, sobre fidelidade e sobre amizade acima de tudo. Ela não pensava em muita coisa não, sempre fora daquelas que preferia deixar acontecer do que se encucar com coisas que talvez nunca valessem a pena. Ficava tranquila enquanto suspirava ou fumava um cigarro na varanda de casa, contando as horas pra poder dormir ou varava noites pensando em como o amanhã poderia ser pior. Em todo o conhecimento que tinha, em todas as pequenas coisas que possuía, os amigos, a faculdade, o emprego. Ela tinha uma vida normal como qualquer um no auge de seus 20 anos de idade. Realizações e frustrações, como sempre.
 Deitou-se na cama e pensou em como seria sua vida depois de formada. Não pensou se iria ou não se casar, isso era o de menos pra ela. Pensou no salário e riu. Pensou nos amigos, nas festas, nos shows e em tudo que poderia fazer. Nas responsabilidades principalmente e lembrou-se que sempre vivera bem, tranquilamente bem, embora pudesse ter alguns pequenos problemas aqui ou alí, mas isso era normal. Ria dos momentos no show do The Pretty Reckless em São Paulo e sussurrava alguns pequenos sonhos antes de adormecer realmente. Ela chegaria a algum lugar, não escolhia aonde iria querer parar, mas ela sabia que chegaria alí. Cedo ou tarde.

 Próximo dalí, havia uma alma que pedia por ajuda. Escondia-se entre sorrisos e pequenas palavras que resumiam tudo o que sentia naquele instante. Estava com um pouco de dor de garganta, nada demais, talvez o inicio de um resfriado ou coisa parecida. Estava cansada também, o dia havia sido complicado e a saudade que sentia de seu amor era quase impossivel de se conter. Escrevia-lhe cartas e mais cartas de amor, querendo derrubar a distancia que parecia ser quase que infinita e isso a deixava assustada. Medo de perder. Coisa comum quando se ama alguém, quando se está com alguem e não se pode estar sempre presente. Engoliu em seco e deixou passar, ficando apenas confusa com toda a situação que estava ocorrendo ao seu redor. Talvez seja o cansaço.
 Atirou seu tenis para longe e apoiou a cabeça no encosto do sofá. Assistiu um pouco sobre as tragédias ocorridas durante o dia e logo adormeceu sem nem perceber. Torcia para que o dia amanhã acordasse um pouco mais quente do que o de hoje, afinal, por mais seco que esteja, nem todo dia é ensolarado pra todo mundo. O medo é um eclipse que toma conta do céu daqueles que podem perder o que ama.

 E eu? Eu só sou uma poeta escrevendo sobre cinco almas diferentes. Quem são eles? Eles sabem. Ninguém precisa saber.

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