Espelhos.

 Brisa gelada quando tirei os pés da quadra naquele instante. O centro da cidade estava uma loucura, carros e mais carros passavam rapidamente, pessoas conversavam, músicas ao fundo, propagandas vindo de longe, vozes estranhas, rostos nem sempre familiares e um quê de quem espera por alguma coisa.
 Como eu não tinha nada melhor pra fazer, resolvi me sentar em um dos canteiros da praça e acender um cigarro. Observava tanta coisa, as pessoas, os olhares desconfiados e as preocupações alheias com o transito e seus destinos finais que me fiz a seguinte pergunta: Será que todos aqui sabem o quanto são solitários? Ou ninguém percebe isso? Ou sou só eu? Sei lá, como qualquer um, eu poderia muito bem dizer que estava observando o mar, tomando uma caipirinha de limão e relaxando. Lembrando-me de todas as frustrações da vida e andando com passos lentos e pesados sobre uma areia movediça, a qual me arrastava e me puxava para um fim que eu desconhecia.
 Ou se eu simplesmente me jogasse no mar e me afogasse no meio daquela agua tão salgada, nadando entre tantos seres que até então, chegam a ser misteriosos e por fim, pudesse andar com meus próprios pés sobre os abismos que ali existiam. Queria observar aqueles peixes, quem sabe conversar com alguns moluscos e convidar tubarões para tomar um conhaque no barzinho do lado da estrela amarela, que talvez pudesser ser o "point" de encontro deles. Talvez nem sejam tão diferentes de nós, talvez pensem até melhor que nós.
 E agora já posso me encontrar dirigindo um desses carros que passava pela avenida movimentada. O semaforo fecha, dou cinco tapas no volante, irritada e um tanto encomodada pela lentidão dos outros motoristas e reclamo de como gostaria de estar em casa depois de um dia estressante, apenas para sustentar os meus desejos mesquinhos e estupidos. Aí, quando ele volta a abrir, corro como se estivesse numa corrida de fórmula um, levo uma multa e mando o guarda ir a puta que pariu. No final das contas, estou presa.
 Daí me lembro de ter pegado o onibus hoje mais cedo. Mais ou menos as cinco da manhã pra poder chegar a tempo no colégio. Aluna de primeiro ano, vida dura de quem mora bem longe da escola e toda aquela vontade de estar presente em algum lugar, mas não estou. Estou a caminho da escola. Depois de sair do onibus, ando com passos lentos até a mesma, já bateu o primeiro sino e cá estou eu, preparada para a aula de matematica, que sempre fora a minha predileta, mas como se fosse normal, a diretora entra na sala e anuncia a morte da Joana. Que já fora uma grande amiga minha, morrera por conta de um estupro na noite passada. Passo a chorar e vou embora pra casa, me perguntando o porque. Ninguém nunca pede pra morrer.
 Então, decido que não tenho medo de morrer. Continuo sentada no canteiro fumando o mesmo cigarro do começo e quando termino o mesmo, levanto-me e vou embora. Quem sou eu agora?

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