Caixinha lilás

 Da última vez que beijei teus lábios, ainda tinham o gosto amargo da cerveja da primeira noite,
 A noite que começou como um desastre, mas que terminou como um filme de Hollywood. Final feliz, eu feliz, você feliz, ou mais ou menos, porém felizes.
 Senti falta desse gosto todos esses dias que andei o substituindo pelo gosto amargo do calmante que me tem feito dormir. A alma de poeta se extinguiu junto com um coração partido, jorrando sangue dentro do meu peito e espalhando hematomas por todos os poros de minha pele tão pálida.
 Eu me pergunto:
 Onde você está?
 O que está fazendo?
 Sinto falta dos seus beijos.
 Penso, repenso, trepenso, relembro de tudo. Suas mãos não me deixam dormir nem a base de morfina.
 Os suspiros do outro lado do quarto já não fazem diferença, nem os roncos, nem os desejos guardados dentro daquela caixinha lilás que esconde a lembrança mais cruel de todas.
 Sua aliança. Minha aliança.
 Seu bilhete.
 Todos aqueles bilhetes que você me escreveu.
 Todos.
 Incluindo o do pão de queijo.
 Todos os bilhetes são melancólicos dentro dessa caixinha tão pequena no fundo do meu armário, me dando calafrios toda vez que suas cores insistem em chamar minha atenção.
 Meu amor era violeta. O teu também. O nosso amor era violeta.
 Violeta como o dia que nasce e dá o lugar para a noite, como você era meu sol e eu era a lua, precisando de ti para brilhar.
 As voltas sem sentido, as lágrimas que se tornaram rotineiras, a falta que tomou conta de todo o meu espaço e substituiu o que dentro de mim havia.
 Me alimento de saudade. Dia após dia.
 Fome não tenho, sede também não.
 Só saudade, saudade, saudade e tristeza.
 É tristeza que não acaba mais.
 Tanta tristeza que o mar aceitaria minhas lágrimas como colaboração para que crescesse.
 Tanta tristeza que nem o mais triste dos homens seria capaz de aguentar.
 A solidão que você deixou entrar pela porta que esqueceu aberta, a aliança de prata que deixou em cima da mesa, o sol que se apagou durante um inverno tenebroso em qualquer cidade russa.
 Pouco uísque, pouco remédio para tanta dor, tanta tristeza...
 Tanta esperança para que não hajam possibilidades.
 Eu continuo a gritar, da janela do meu quarto, num dia de chuva, com os bilhetes manchados pelo sangue que escorre friamente de minhas veias ao te esperar.
 Onde está você agora?
 Bárbara.

Bookmark the permalink. RSS feed for this post.

Leave a Reply