Eu contradizia minhas bobagens. Talvez por razões inúteis eu preferisse ficar em silêncio ao aceitar o fato de que toda noite antes de dormir, eu lembrava de você e de tudo que fiz de errado e isso dói. Dói bastante. Daí o que me resulta tantos pensamentos turbulentos, são lágrimas sinceras, quentes e salgadas de olhos que já viram tudo aquilo que se pode apertar o peito e eu continuava assim, tragando um cigarro ou outro e jogando papo fora, conversando com borboletas azuis que pousavam na janela ao lado. Mesmo que fosse de noite.
Estava de férias e estava na praia, sentava-me na areia enquanto observava alguns tratores limpando o que havia por ali, as ondas insistiam em invadir um pouco mais a areia, alcançando meus pés descalços que sentiam a agua tão gelada quanto a brisa que levava embora consigo, todas aquelas memórias bobas de um dia que parecia não ter fim e eu continuei alí, sem mais nada e sem esperanças.
Um pescador, de barbas brancas e cabelos longos logo se aproximou, não dei muita importancia a sua presença pois estava esperando algo que nem eu mesmo sabia o que era. Ele se sentou ao meu lado e logo me perguntou o que havia de errado.
- Não tenho nada não.
- Percebe-se. As ondas tentam lhe acompanhar mas você não quer acompanha-las.
- Perdão?
- Não quer acompanha-las.
- A não ser que eu queira me afogar, não?
- Não seja estúpido.
- A propósito, quem é você?
- Eu lhe faço a mesma pergunta.
- Ora! Você que resolveu se sentar ao meu lado.
- Sim.
- Então acho que me deve a resposta.
- Não devo nada não. - E sorriu. Tinha olhos bem azuis. - Você é um rapaz jovem, não precisa saber quem sou eu.
- A não ser que seja um estuprador. - Ele riu, bem humorado.
- Pessoas do seu tipo não me atraem, mas não estou aqui por isso.
- Então o que você quer de mim?!
- Quero lhe ajudar. As marés me trouxeram até aqui. Uma onda me disse que havia um rapaz infeliz sendo banhado por elas.
- Como? Não estou entendendo.
- Ora! Não seja bobo! Está infeliz.
- Não estou não.
- As ondas querem tirar essa dor que você está sentindo. O que aconteceu?
- Nada, nada aconteceu. Pode me deixar sozinho por favor?
- Não enquanto estiver passando sua tristeza para o mar... Como se chama?
- Paulo.
- Paulo... Vou lhe contar um segredo sobre o mar.
- ...Tudo bem...
- Quando se está triste e as ondas presenciam sua tristeza, ou melhor, você transfere essa tristeza para as ondas calmas e pacificas, o mar se entristece e sabe por que?
- Por que?
- Ele vive de energias. Positivas e negativas. Quando as pessoas estão tristes, elas costumam vir aqui e observa-lo, para se sentirem melhor, não?
- É, acho que sim.
- Então. Não deixe as ondas tristes, não deixe que elas levem essa tristeza pelas correntes e que cheguem aos outros continentes. Não deixe que se espalhe, não deixe que todos os continentes recebam essa tristeza que lhe parte a alma. Se está assim por causa de uma garota, não se sinta culpado por nada que fez.
- Como sabe que a culpa foi minha?
- As ondas não mentem. - E sorriu.
- Mas... Eu nem...
- Você não precisa falar, as lágrimas que o vento leva explicam tudo. As lágrimas que você derramou aí, nesse grande mar azul, já explicam. Não se afobe, não se apresse, não se arrependa e não se sinta mal. Todos erram uma vez na vida. Uma não, duas, três, quatro.
- Mas eu a amo e eu a perdi.
- Se a ama, tenha paciência e se tiver, quem sabe a maré não a traga de volta pra você, não acha?
- Impossivel. Ela está com outro e está feliz assim.
- Ela o ama.
- Sim, ela o ama.
- Não desista. Ela desistiu de você?
- Nem quando eu resolvi negar.
- Então não desista. Sabe, eu costumo dizer que se você navegar na direção certa, sempre encontrará o caminho e a solução, os portos em que você resolver parar, são apenas consequencias.
- E depois?
- E depois a maré te leva, aí você chega lá. Bem longe. Mas se for preciso, reme. Reme bastante. Reme que as ondas te levam, reme contra a maré, seja mais forte e não perca seu rumo de vista. Uma hora ou outra você pode se perder, mas acaba se encontrando. Minha vida é um grande mar azul, sem direção. A maré me leva pra onde ela quiser e se eu traçar rotas, eu remo para que não me afaste delas. Faça o mesmo e não se perca. - Ele se levantou e partiu, sem nem me explicar mais nada, mas acho que isso já bastava, sorri e interrompi uma das ondas que tentava me acordar. Senti frio, senti medo, mas quando percebi, eu já estava remando em alto mar, sem direção, apenas sendo levado pela maré azul e calma que fazia o mar adormecer durante um banho de luz, luz da lua, das estrelas ou do sol. Dia e noite, noite e dia.
O pescador de ilusões.
![](http://img2.blogblog.com/img/icon18_edit_allbkg.gif)
Enviar por e-mailPostar no blog!Compartilhar no TwitterCompartilhar no FacebookCompartilhar com o Pinterest